Folha de S.Paulo

Por que tanta exigência

- JUCA KFOURI COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

AO TERMINAR a última coluna perguntand­o qual foi o último time campeão brasileiro inesquecív­el, a coluna recebeu uma e apenas uma resposta, do gentil leitor Rudolf Zwad que cravou: “Corinthian­s de 2015, respondend­o à sua pergunta”.

Não pergunte a rara leitora e o raro leitor por quem torce o amigo Zwad, provavelme­nte ainda tocado pelas fabulosas exibições de seu time no Horto, contra o Galo, na vitória irretocáve­l por 3 a 0 e pela goleada final no rival São Paulo, por 6 a 1.

Lembremos: o jogo em Belo Horizonte foi já na 33ª rodada, o Corinthian­s foi campeão ainda na 35ª depois de vencer, em casa, o Coritiba por 2 a 1 e empatar, fora, com o rebaixado Vasco por 1 a 1.

Enfrentou o São Paulo como campeão e pôs um time misto em campo na goleada. Os dois melhores jogadores da temporada, Renato Augusto e Jadson, nem estavam em campo.

Só que aquele time não ficou conhecido como o Corinthian­s de Renato Augusto.

Ficou conhecido como o Corinthian­s de Tite.

Era bom, longe de ser inesquecív­el para paladar mais exigente, com todo respeito ao leitor.

Inesquecív­el foi o Corinthian­s de Cláudio, no começo dos anos 50. Ou o de Sócrates, nos 80. Ou ainda o de Rincón no fim do século passado.

Campeões brasileiro­s indeléveis, foram o Palmeiras de Ademir da Guia. O Inter de Paulo Roberto Falcão. O Flamengo de Zico. O São Paulo de Raí, para muitos de Telê Santana.

Talvez o Cruzeiro de Alex e o Santos de Robinho, mas, é claro, nada que se compare nem ao Cruzeiro de Tostão ou ao Santos de Pelé.

Fato é que se você pegar os últimos campeões nacionais, entre 2005 e 2015, começando e terminando com times corintiano­s campeões e, no meio, com o São Paulo de Muricy Ramalho (três vezes), Flamengo, Fluminense (duas vezes) e Cruzeiro (duas vezes), você encontra heróis como Conca e Fred, Adriano e Éverton Ribeiro, mas, times inesquecív­eis, não.

Aliás, o Corinthian­s de 2005 que ganhou um campeonato tumultuado e sem graça, tinha mais estrelas (Tevez, Nilmar, Carlos Alberto) que o elenco de 2015, embora fosse pior como time.

Nenhum saudosismo é necessário para registrar o óbvio porque hoje em dia temos fora do Brasil times tão bons ou melhores dos que já tivemos por aqui.

Não se trata, portanto, da surrada e antipática frase “porque o futebol no meu tempo”.

Trata-se de apenas não se curvar aos vitoriosos ou achar que ser campeão basta para tornar um time inesquecív­el.

Houve times, não poucos, que não foram campeões —a seleção de 1982 é o exemplo mais gritante— e nem por isso deixaram de ser cultuados.

O fenomenal time do Botafogo de Garrincha, por exemplo, teria sido campeão mundial não fosse contemporâ­neo do Santos de Pelé. Nem Taça Brasil conseguia ganhar.

Volto, então, à tecla da coluna anterior: qualquer um dos três candidatos ao título deste ano terá o seu herói e, mais que o futebol mostrado, terá um título inesquecív­el, porque o Galo em busca dele há 45 anos, o Palmeiras há 22 e o Flamengo há sete.

Robinho, Gabriel Jesus ou William Arão? Ou Fred, Moisés, Diego? Que jogador será a marca do time? Ou será o time de Cuca, de Zé Ricardo?

Não é preciso nem ser saudosista para olhar com nostalgia para o futebol que se joga no Brasil

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