Folha de S.Paulo

DESCANSA MEUS OLHOS...

Sul da ilha é menos disputado que o norte e conserva oásis com faixa de areia intocada e muita área verde

- ROBERTO DE OLIVEIRA

Quem já foi há de concordar: com tantas atrações, Florianópo­lis é daqueles lugares que, a cada viagem, a gente sempre volta para casa fazendo as contas do que deixou para trás sem conhecer.

Pedacinhos de areia ainda intocados com trilhas que cortam morros tomados pela mata e terminam numa praia que dá pra encher o peito e gritar: “Gente, é só minha”.

Ah, Floripa... Dois mundos num mesmo pedaço. De um lado, um roteiro badalado, com ares de St. Tropez —ou seria Bevery Hills? Do outro, resquícios do legado da colonizaçã­o açoriana, praias selvagens, gente simples e recantos em terra e beira-mar.

Se o norte da ilha é a região propícia para o agito, território apinhado de argentinos, o sul ainda mantém áreas preservada­s para uma turma que, ao valorizar cenários verdejante­s, está à procura de um contato mais íntimo com a natureza e um flerte com a história, como o oferecido pela bucólica Ribeirão da Ilha, uma das primeiras comunidade­s de Santa Catarina.

Eis um belo pretexto para esta edição se debruçar sobre aquela parte da “ilha da magia”, como Florianópo­lis é carinhosam­ente chamada.

Tome como exemplo a distante e deserta praia do Saquinho, na extremidad­e sul. Com uma pequenina faixa de areia desenhada entre rochas, de fundo para um morro coberto pela exuberânci­a da mata atlântica, a praia é acessada por uma trilha calçada que passa por dentro de uma floresta. São cerca de 30 minutos, contornand­o o costão, com vista geral e irrestrita das praias da Solidão e dos Açores, seguindo até o contorno final da baía, no Pântano do Sul, com seus barquinhos a colorir o horizonte.

A solidão é quase certeira, tanto no caminho de ida quanto no de volta, acompanhad­a pela sinfonia de pássaros e o estouro do mar nas rochas. É de arrepiar. RELAXA, MANÉ Por aqueles lados ainda resistente­s à expansão imobiliári­a, uma trilha íngreme, que leva uma hora (ou três vezes isso, se sair de Matadeiro), conduz até a praia mais preservada de Florianópo­lis: Lagoinha do Leste.

Se o mar assim permitir, uma viagem de barco (cerca de 15 minutos, partindo de Pântano do Sul) conduz os visitantes mais sedentário­s até sua área, praticamen­te intocada, que é a predileta de dez entre dez dos aventureir­os.

Mínimo esforço, contudo, é o simples atravessar a passarela que liga a praia de Armação à ilha das Campanhas, de onde se tem a melhor vista da praia do Matadeiro, que, como o nome anuncia, era local em que se matavam baleias —hoje, moradores relutam em aceitar em suas águas a chegada da maricultur­a, atividade de criação de ostras que se espalha por Floripa.

Para chegar até a pequenina ilha, pare nos arredores da igreja de Sant’Anna, construída em 1772, onde arpoadores e tripulante­s das baleeiras se confessava­m e ouviam missa antes de dar início à pesca.

Desça até o deque de madeira da Armação, de costas para a igreja e de frente para o mar. Siga à direita, pela areia, até a passarela de madeira. Logo irá avistar o vaivém animado de pescadores.

A ilhota das Campanhas nos oferta bem mais do que uma bela vista, como se isso não bastasse. É ali também que o “manezinho”, como são chamados os nativos — e aqui não há tom jocoso no apelido— ainda mantém a sua essência mais autêntica.

Exemplo de resistênci­a de que no sul o aspecto rústico da pesca ainda permeia as relações de contato entre forasteiro­s e seus moradores, donos de um peculiar sotaque.

Até tarde da noite, lá estão eles em alerta a qualquer movimento do anzol. A presença dos pescadores, sempre cercados por familiares e muitas crianças, confere um clima de vilarejo, aconchegan­te a quem por ali passeia.

O lado sul de Floripa é mais ou menos assim: um contato mais intimista tanto com a natureza quanto com seu povo. É para descansar os olhos, cansar o corpo, sossegar a mente e se encher de luz.

Pode apostar, quem ali pisar vai querer voltar.

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