Folha de S.Paulo

Setor formal encolhe e vaga sem carteira volta a crescer

Com salário menor, aumento da informalid­ade trava retomada econômica

- FERNANDA PERRIN

Redução de postos formais na construção foi de 4,2% em um trimestre; alta no setor informal foi de 10,7%

A perda de empregos no mercado formal tem levado muitos trabalhado­res a aceitar vagas sem carteira assinada neste ano, com salários mais baixos e sem garantias.

Produto da recessão em que o país mergulhou há dois anos, o fenômeno contribui para atrasar a retomada da economia. Os rendimento­s do trabalho informal são, em média, 40% inferiores aos do setor formal, o que reduz o poder de compra das famílias, um dos principais motores da atividade econômica.

O aumento da informalid­ade também prejudica as receitas do governo, porque o desemprego e a migração dos trabalhado­res para vagas sem carteira assinada reduzem as contribuiç­ões à Previdênci­a.

Levantamen­to feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a) mostra que, entre o primeiro e o segundo trimestres de 2016, foram cortadas 226 mil vagas com carteira assinada e 259 mil pessoas deixaram de trabalhar por conta própria. Do lado informal, porém, houve uma expansão de 668 mil postos no período.

“As pessoas estavam se virando sozinhas, tentando formar seu próprio negócio. Mas neste ano o conta própria caiu. Ou seja, essa alternativ­a se esgotou”, diz Fernando de Holanda Barbosa Filho, economista da FGV (Fundação Getulio Vargas) no Rio.

Isso indica uma crise tão profunda que não houve demanda suficiente nem mesmo para sustentar o trabalho por conta própria, diz Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese (Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos).

Um dos setores com maior aumento de informalid­ade foi a construção civil. O número de postos de trabalho com carteira assinada caiu 4,16% do primeiro para o segundo trimestre, enquanto as vagas informais cresceram 10,7%.

A construção, setor em que a informalid­ade é historicam­ente elevada, passou por um processo de formalizaç­ão nos últimos anos, puxado por obras públicas e pelo aqueciment­o do setor imobiliári­o.

Com a retração, esse movimento arrefeceu, e o mercado informal, de pequenas obras e reformas, voltou a ganhar espaço, diz Ana Maria Castelo, coordenado­ra de projetos sobre o setor na FGV do Rio.

Dinâmica semelhante foi observada entre os empregados

FERNANDO BARBOSA FILHO

economista do Ibre/FGV domésticos, categoria em que o número de vagas formais caiu 4,6% e houve alta de 3,4% dos sem carteira.

O nível de informalid­ade no mercado de trabalho brasileiro é historicam­ente alto, mas vinha caindo nos últimos anos. No fim de 2012, 53% dos trabalhado­res tinham carteira assinada —pico da série estatístic­a do IBGE, iniciada naquele ano. No segundo trimestre de 2016, os trabalhado­res com carteira eram 49%.

Essa recaída, porém, deve ser revertida com a retomada do cresciment­o, afirma o economista Hélio Zylberstaj­n, da USP (Universida­de de São Paulo). “Os fatores que contribuír­am para a formalizaç­ão da economia, como maior escolarida­de, maior fiscalizaç­ão e nota fiscal, continuam”, diz Barbosa Filho, da FGV.

Para ele, a diferença é que atualmente, com o encolhimen­to do mercado formal, muitos trabalhado­res acabam obrigados a optar por empregos de pior qualidade, sem a mesma proteção oferecida pelas vagas formais e com salários inferiores. Número de trabalhado­res, em milhões Formal Construção > 1º tri.2016 2,13 1,26 > 2º tri.2016 2,04 1,39 Informal

As pessoas estavam se virando sozinhas, tentando formar seu próprio negócio. Mas neste ano essa alternativ­a se esgotou

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