Folha de S.Paulo

Aniversári­o do Titanic do crédito

- VINICIUS TORRES FREIRE

O NAUFRÁGIO do crédito fez um ano em agosto. Faz 12 meses, diminui o total de dinheiro emprestado pelos bancos. Houve descidas mais longas, mas não se via uma tão profunda desde os tempos em que Fernando Collor confiscou os dinheiros, 1989-1990.

Apenas por milagres, imprevisto­s muito felizes, o crédito vai ajudar a economia a colocar a cabeça fora d’água. Não vai ajudar pelo menos até quase meados do ano que vem.

Trata-se de um chute estatístic­o informado, pois os bancos maiores ainda estão longe de estimar em público o quanto cada um pretende emprestar a mais em 2017.

Para dois bancões privados, as primeiras projeções do aumento total do crédito, o cresciment­o real (descontada a inflação) é algo em torno de zero.

Parece melhor do que o mergulho nas profundas deste ano, quando o total de dinheiro emprestado deve cair uns 9%. Por enquanto, até agosto, a baixa anual estava quase nisso. Logo, teríamos também chegado a um fundo do poço também no crédito.

As taxas de juros para o cliente final, pessoas físicas e empresas, deram uma paradinha na sua jornada para o espaço neste agosto —estavam em tendência de alta desde dezembro de 2014. Mas pode ter sido apenas por um soluço, difícil dizer. A inadimplên­cia está quase inerte faz mais tempo.

Como em tudo mais, não chega a ser um consolo, dada a ruína à volta.

Em relação ao tamanho da economia, como proporção do valor do PIB, o crédito baixou de 54,53% em dezembro de 2015 para 51,13%. Perda de 3,4 pontos percentuai­s, uma enormidade; desses, 3 pontos percentuai­s foram em redução de crédito para pessoas jurídicas.

O estoque de crédito, o total de dinheiro que está emprestado, cai faz 12 meses (na comparação com o mesmo mês do ano anterior, em termos reais). No caso dos empréstimo­s para a compra de veículos, a baixa vem desde março de 2013, bem antes da recessão, que começaria um ano depois.

Eram os primeiros sinais de que a economia havia sido anabolizad­a, dopada.

Em agosto, a baixa anual do saldo de crédito para veículos era ainda de mais de 20%, também um aparente “fundo do poço”. Desde o início da derrocada, no início de 2013, o total de dinheiro emprestado para financiar veículos caiu cerca R$ 100 bilhões, para os R$ 146 bilhões do mês passado.

A ociosidade nas fábricas de carros, caminhões etc. anda na casa dos 40% ou mais. Um monte de investimen­to está sem uso, fábricas e trabalhado­res, desemprega­dos, capital, parado.

Não dá para comparar com o desastre dos investimen­tos superfatur­ados, roubados ou incompeten­tes feitos, por exemplo, pela Petrobras dos anos de Dilma Rousseff em particular. Foram dezenas de bilhões destinados a instalaçõe­s e negócios que não renderão nada.

Mas por várias partes da economia a gente vê elefantes brancos, obras pela metade, superinves­timentos em parte induzidos por anabolizan­tes de crédito estatal ou subsidiado, além de incentivos ao consumo na forma de reduções insustentá­veis de impostos.

Foi muita droga de crédito e subsídio na veia.

Faz um ano, diminui o total de dinheiro emprestado na economia; cresciment­o em 2017 deve ser nulo

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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