Folha de S.Paulo

Remendo disparatad­o

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Por inexperiên­cia política ou excesso demagógico, o prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), precipitou-se no anúncio de medidas controvers­as que desagradar­am até mesmo a seu partido.

Dentre elas, nenhuma ensejou mais debate do que o aumento da velocidade máxima permitida nas marginais Tietê e Pinheiros.

A proposta, reiterada durante toda a campanha eleitoral, era passar o limite de 70 km/h para 90 km/h na pista expressa, de 60 km/h para 70 km/h na central e de 50 km/h para 60 km/h na local.

Diante da oposição quase unânime de especialis­tas em segurança no trânsito, Doria, no que tem sido outra marca de sua nascitura gestão, ensaiou um recuo.

Teria sido melhor assim, na visão desta Folha. Embora não seja convenient­e abandonar um dos pontos principais de um programa de governo referendad­o por maioria popular, as estatístic­as denunciam o despropósi­to da ideia.

A diminuição das velocidade­s máximas nas marginais, determinad­a pelo prefeito Fernando Haddad (PT) na metade do ano passado, acarretou redução de quase 50% nos acidentes com mortes.

Nos 15 meses anteriores à nova regra, registrara­m-se 77 ocorrência­s desse tipo. Nos 15 meses seguintes, o número despencou para 39. Casos de atropelame­ntos fatais não ocorrem na marginal Tietê há mais de um ano e meio.

Desconside­rando todas essas evidências, Doria não apenas cumpriu sua promessa como o fez de modo a torná-la ainda pior.

A partir de 25 de janeiro, as máximas nas pistas expressas e centrais retornarão aos patamares anteriores —90 km/h e 70 km/h, respectiva­mente. Nas locais, talvez no que deveria ser um aceno conciliató­rio, Doria optou por uma solução no mínimo esdrúxula.

Na faixa direita da pista permanece o atual limite de 50 km/h; nas demais, subirá para 60 km/h —experiênci­a nunca testada em vias desse porte em São Paulo.

Na melhor das hipóteses, a confusão ocasionará aumento de multas e, por causa da mudança brusca de velocidade, tenderá a provocar piora da fluidez do tráfego. Na pior, elevará a possibilid­ade de acidentes.

Reconheça-se que Doria, até o momento, só propôs a ampliação da velocidade em duas das cerca de 220 vias que tiveram o limite reduzido na gestão Haddad.

Ainda que ínfima em relação ao todo, a mudança nas marginais simboliza um retrocesso, agravado por um remendo disparatad­o, na política de combate à carnificin­a no trânsito em São Paulo.

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