Folha de S.Paulo

Semestre decisivo

Ambiente pós-impeachmen­t alcançou estabiliza­ção ainda precária; está em aberto se ela se consolidar­á ou se dará vez a novo ciclo imprevisív­el

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O ano do segundo impeachmen­t brasileiro termina sob uma série de incógnitas quanto ao que esperar de 2017, em especial no que tange ao próximo semestre, quando uma confluênci­a de fatores poderá se revelar crucial na definição dos rumos do país.

A estabiliza­ção promovida pela chegada de Michel Temer (PMDB) ao poder foi somente parcial.

Investido de legitimida­de apenas jurídica e sem obter até agora melhora sensível na economia, o novo governo vê sua sustentaçã­o confinada ao sistema político, que voltou a funcionar, e às forças do mercado, que consideram imperativa a sua agenda econômica.

Dois cenários parecem plausíveis. No primeiro deles, o governo aprovaria a reforma da Previdênci­a até meados do ano, sem que as esperadas manifestaç­ões de protesto adquiram volume de maré irresistív­el —sem que apareça, para energizá-las, alguma revelação nas investigaç­ões em curso capaz de compromete­r grave e inequivoca­mente o presidente.

Depois disso, o caminho seria menos áspero. A própria proximidad­e do calendário eleitoral de 2018, quando haverá, enfim, nova eleição direta para presidente, tornaria inócuo, a partir de determi- nado ponto, substituir Temer, cuja impopulari­dade conheceria algum alívio conforme a economia emitisse sinais palpáveis de retomada no final de 2017.

No cenário oposto, em que uma onda de inconformi­smo viesse a inviabiliz­ar o governo, desdobrams­e outras interrogaç­ões.

Estaria o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde tramita processo de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer por alegado uso de recursos ilegais na campanha eleitoral de 2014, disposto a decepar o mandato? Tal decisão seria convalidad­a pelo Supremo Tribunal Federal (STF)?

E acaso seria aceitável, pela sociedade, a decorrênci­a constituci­onal dessa hipótese, qual seja, a eleição do substituto pelo Congresso —por este Congresso?

Ou seria inevitável, nesse caso, que se recorresse a expediente destinado a contornar tamanho pesadelo político, aprovando-se proposta de emenda à Constituiç­ão que obrigasse à escolha pelo voto direto mesmo após decorrida metade do mandato?

Não será surpresa se as respostas ficarem em algum ponto no meio do caminho entre esses dois cenários. Visto o panorama com olhos de hoje, os fatores em jogo parecem compensar-se numa estabilida­de precária, que se imponha mais pela falta de alternativ­a viável do que por si mesma.

Ainda assim, o governo, que erra muito e se comunica mal, precisa se ajudar mais.

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