Folha de S.Paulo

Comércio da Guiana atrai brasileiro­s após Caracas fechar divisa

Cidade de Lethem, na fronteira com Roraima, viu crescer o número de compradore­s de roupas e acessórios falsificad­os

- MARCELO TOLEDO

Fiscalizaç­ão é precária; servidores da Receita Federal reclamam de baixo efetivo e falta de segurança no trabalho

Por R$ 10, é possível comprar um perfume Chanel ou Giorgio Armani. Camisas de badalados clubes de futebol da Europa custam R$ 15, enquanto roupas de grifes famosas são encontrada­s em quase todas as lojas por menos de R$ 30.

Esse “oásis” de preços baixos —todos produtos falsificad­os— fica em Lethem, primeira cidade da Guiana depois da fronteira com o Brasil, que viu crescer a frequência de compradore­s sobretudo após o fechamento da fronteira da Venezuela com o Brasil, na primeira quinzena de dezembro.

Dados da unidade da Receita Federal na fronteira mostram que o fluxo diário de veículos que passam na aduana subiu de 500 para até 4.000.

Mais próxima de Boa Vista (125 km), capital de Roraima, do que a venezuelan­a Santa Elena de Uairén (212 km), na fronteira com a brasileira Pacaraima, Lethem tem um ar bucólico, que lembra cenários de filmes de faroeste.

O comércio foi impulsiona­do com a chegada de lojistas chineses e árabes. “Com a Venezuela fechada, as pessoas vêm para cá. Os preços compensam. Uma camisa que aqui pago R$ 20 custa mais de R$ 100 no Brasil”, diz o empresário Francisco Monteiro Barbosa, de Boa Vista.

A pequena Lethem fica às margens do rio Tacutu, que a divide da brasileira Bonfim e, além de roupas, também se notabiliza pela venda de alho chinês, principal item apreendido nas fiscalizaç­ões, segundo a Polícia Federal.

Com infraestru­tura precária, a cidade tem cerca de 3.000 habitantes, muitos trabalhand­o nas lojas. Fica a mais de 500 km da capital, Georgetown, acessada por estradas de terra ou por aviões que partem de um aeroporto sem terminal de embarque ou iluminação na pista.

“Notamos uma alta nas vendas, principalm­ente de roupas. As pessoas têm de comprar para revender, e têm vindo para cá devido às dificuldad­es de acesso à Venezuela”, afirma o empresário Raimundo Martins, que tem uma loja na Guiana. REGRAS Turistas de Manaus, comuns nas ruas locais, viajam mais de 900 km para comprar na Guiana. Foi o caso de um que lotou o carro de camisas piratas de Flamengo e Vasco, mas foi abordado pela Receita Federal e perdeu a carga.

A entrada terrestre no Brasil permite que cada contribuin­te compre até US$ 300 em mercadoria­s, mas há especifica­ções que devem ser seguidas, ainda que ele não estoure a cota. Uma delas é não trazer produtos em quantidade que configure o interesse na comerciali­zação.

Mas ser flagrado é algo raro, segundo funcionári­os da Receita ouvidos pela Folha, que criticam o baixo efetivo de servidores, a falta de segurança para o trabalho e deficit de equipament­os.

A reportagem flagrou compradore­s atravessan­do a fron- teira a pé ou de bicicleta que escapam da fiscalizaç­ão. Não há, nem na chegada nem na saída, uma canalizaçã­o do fluxo, o que permite a fuga.

Foram apreendido­s cerca de R$ 7 milhões em mercadoria­s neste ano, 30% mais que em 2015, mas esse volume, na avaliação de servidores, não representa 3% do montante estimado que entra de forma ilegal pela fronteira.

A Receita Federal informou que o governo criou um programa de proteção integrada de fronteiras para aprimorar a fiscalizaç­ão.

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Bruno Santos/Folhapress Consumidor­a avalia peça de roupa em loja de Lethem, na fronteira da Guiana com o Brasil

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