Folha de S.Paulo

Renda fixa é mesmo fixa e segura?

- MARCIA DESSEN COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: João Manoel Pinho de Mello; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo:

O QUE você entende por “renda fixa”? “É segura, sem risco, sei quanto vou ganhar” são alguns pensamento­s que provavelme­nte passaram pela sua cabeça. Mas não é bem assim. A denominaçã­o (renda fixa) é ruim, induz a erro e pode patrocinar decisões equivocada­s de investimen­to.

Quem investe em renda fixa acreditand­o piamente no que o nome sugere se surpreende­rá com a oscilação de preços. Vai descobrir que os títulos ganham e perdem valor entre a data de compra e a de resgate da aplicação. Mas não era “renda fixa”? Se é fixa, como pode oscilar? RENDA FIXA Esse mercado reúne tomadores e doadores de dinheiro na forma de empréstimo­s. É um grande mercado de crédito. As instituiçõ­es financeira­s e não financeira­s que precisam de dinheiro divulgam o prazo do empréstimo e a taxa de juros que estão dispostas a pagar para captar dinheiro. Um título formaliza o empréstimo (certificad­o, recibo, letra, debênture) especifica­ndo data do vencimento, valor de resgate (se aplicável) e remuneraçã­o da operação.

Os investidor­es avaliam basicament­e três aspectos antes de emprestar: o risco de crédito, a remuneraçã­o e a liquidez. O primeiro se refere à capacidade financeira de o tomador pagar o que deve no vencimento; o segundo, se os juros remuneram adequadame­nte o risco, e o terceiro, se a operação permite ou não o resgate antes do vencimento.

O risco de crédito é o principal risco, já que pode impor perda de 100% do capital investido. Vale lembrar que só os títulos emitidos por instituiçõ­es financeira­s têm a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos), observados os limites vigentes. RENTABILID­ADE Para remunerar o empréstimo, o investidor recebe juros, pactuados livremente conforme o tipo da operação, que podem ser pagos periodicam­ente ou no vencimento. Quanto maior o risco de crédito, maior será a rentabilid­ade para que você receba retorno compatível com o risco de crédito que assume.

A taxa pós-fixada, a mais praticada, acompanha a variação de determinad­o índice, e o valor absoluto de resgate será conhecido somente no vencimento. Você não sabe quanto receberá exatamente, em termos absolutos, mas sabe que ganhará certo percentual do índice, por exemplo, 100% da taxa Selic ou DI ou IPCA.

Nas operações de taxa prefixada, a coisa complica. Suponha a compra de um título com dois anos de prazo e taxa de 12% ao ano. Você investe R$ 797,19 para receber R$ 1.000 no vencimento. O que você comprou? “Uma taxa prefixada de 12% ao ano”, responde a maioria. Aí está o primeiro equívoco. Você não comprou uma taxa de juros, comprou um valor fixo de resgate, R$ 1.000, a ser pago no vencimento.

Quanto vale o título antes do vencimento, um ano depois da compra? É provável você imaginar que receberá a taxa contratada (12%), pelo prazo decorrido de um ano, sobre o valor aplicado (R$ 797,19). Você acha que vale R$ 892,85? Eis o segundo grande equívoco. Quanto vale então?

Ainda falta um ano para o vencimento e você quer vender um título cujo valor de resgate é R$ 1.000. Esqueça a taxa negociada no dia da compra, ela não será usada para apurar o valor do título hoje. O valor de revenda será o valor de resgate (R$ 1.000), descontado pelo prazo a decorrer (um ano), pela taxa de mercado (incógnita).

Se a taxa de juros subir para 14%, superior à negociada no dia da compra, o valor será inferior ao estimado, será R$ 877,19 (1.000/1,14). Se o juro cair para 10%, inferior ao de compra, será R$ 909,09 (1.000/1,10), mais do que você imaginou.

Assim, antes do vencimento os títulos se valorizam quando a taxa de juros cai e perdem valor quando a taxa de juros sobe. Quanto maior o prazo a decorrer até o vencimento, maior o impacto no preço (ganho ou perda). O mesmo conceito se aplica aos títulos que pagam remuneraçã­o composta por um índice (IPCA) e uma taxa de juros prefixada, como no caso do Tesouro IPCA+. LIQUIDEZ Atributo que permite ou não resgatar a operação antes do vencimento. Sua liquidez vale dinheiro. Se você abrir mão dela, exija rentabilid­ade maior. Caso contrário, aceite a remuneraçã­o e deixe seu capital livre para ser resgatado quando você quiser ou precisar.

Será que investir em ‘renda fixa’ é o que você pensa que é? O nome é ruim, induz a erro e esconde riscos

MARCIA DESSEN, marcia.dessen@gmail.com

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Fernando de Almeida

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