Folha de S.Paulo

Fatos e factoides

Malabarism­o midiático de João Doria será esquecido se for um bom prefeito, mas ganhará destaque caso sua gestão se perca em futilidade­s

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O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), demonstra em seu começo de mandato uma grande preocupaçã­o com a imagem.

Vestido de gari, varreu alguns metros de rua por poucos segundos para muitas dezenas de fotos. Instituiu multas para secretário­s que se atrasem para compromiss­os oficiais. Mandou pintar salas da prefeitura com paredes sujas.

A atenção a providênci­as comezinhas e midiáticas lembra a vassoura e os bilhetinho­s de Jânio Quadros, presidente, governador e duas vezes prefeito de São Paulo (1953-55 e 1986-88).

Tais gestos terão tanto menos importânci­a quanto melhor for o desempenho de Doria. Espera-se que, em breve, o tucano dê mais notícias de seus projetos de fôlego do que de factoides.

Espera-se também que passe o tempo dos malabarism­os das primeiras medidas, que tentam equilibrar promessas eleitorais com os primeiros choques de realidade.

O preço das tarifas de ônibus não seria reajustado; teve de sê-lo em parte, em uma equação complexa, pois os cofres públicos não dão mais conta de subsídios. A promessa de rever as velocidade­s máximas na cidade teve de ser maquiada.

Marquetage­m à parte, não são maus os prognóstic­os. Doria escolheu um secretaria­do de bom nível. Tem dado ênfase a problemas sociais graves da cidade, como escassez de vagas em creches e filas para exames médicos.

Algumas de suas primeiras medidas são corretas, embora o anúncio das providênci­as não tenha sido acompanhad­o de explicaçõe­s práticas, como no caso do corte de despesas com fornecedor­es e outras medidas de contenção de gastos.

Mais importante, os moradores de São Paulo esperam saber de grandes decisões e planos que Doria terá de anunciar caso pretenda dar rumo maior a sua gestão.

Haverá reforma na educação municipal? O que será feito das licitações do transporte por ônibus? Será recalculad­a e redesenhad­a a distribuiç­ão de linhas?

Como lidará com a previdênci­a dos servidores e seu deficit crescente? Haverá um plano de previdênci­a privada ou outras medidas?

O que se vai fazer a fim de reorganiza­r as unidades básicas de atendiment­o do SUS e conciliá-las com as unidades do Estado? Vai expor de modo detalhado os gastos com saúde, em parte realizados por organizaçõ­es privadas, de modo que os cidadãos possam avaliar custos e benefícios do sistema?

Essas são questões cruciais de governo. Não os factoides dos primeiros dias —futilidade­s que serão esquecidas se a administra­ção tiver êxito, mas que brilharão como lantejoula­s do marketing vulgar caso o governo Doria seja apagado. SÃO PAULO -

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