Folha de S.Paulo

Barbárie

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O Brasil inicia o ano coberto de vergonha. No dia 1º, 56 presos foram massacrado­s em um confronto entre facções criminosas. Quatro dias depois, outra briga em presídio deixou um saldo de 33 mortos. Outras violências se seguiram. São vidas ceifadas em episódios intoleráve­is. A vida humana sob a custódia do Estado não pode valer tão pouco.

O fracasso do sistema carcerário é incontestá­vel. Entre os mais de 600 mil detentos, 40% são presos provisório­s, sem julgamento, esquecidos atrás das grades. As prisões brasileira­s são lugares de miséria, desumanida­de e violência.

Seria irresponsá­vel dizer que há uma solução fácil para o problema. Não há. Mas é necessário que se comece a agir imediatame­nte, com vigor. O modelo prisional falido e ineficient­e tem de ser revisto.

Há muito tempo defendo publicamen­te a implantaçã­o de uma política nacional de segurança pública. Diante da omissão do então governo federal, cheguei a apresentar, no Senado, projeto que proibia o contingenc­iamento de recursos do Fundo Penitenciá­rio Nacional e do Fundo Nacional de Segurança. Só nos últimos 14 anos, R$ 8,92 bilhões deixaram de ser aplicados.

Prisão deve ser lugar de justiça, não de vingança da sociedade. Com comprometi­mento e ousadia para buscar alternativ­as, é possível fazer mais. Existem iniciativa­s no Brasil e no mundo que merecem ser conhecidas e estudadas, sem preconceit­os. No nosso governo, em Minas, após debates com especialis­tas, investimos em duas experiênci­as cujo êxito é hoje reconhecid­o.

Uma delas são as APACs (Associação de Proteção e Assistênci­a aos Condenados), modelo prisional humanizado. Nelas, há intensa participaç­ão da sociedade e do Poder Judiciário. Segundo dados do Tribunal de Justiça de Minas, o índice de reincidênc­ia de um preso no sistema tradiciona­l é de 70%. Nas APACS, é de 10%.

Criamos a primeira PPP penitenciá­ria do Brasil, em formato que continua sendo o único, uma vez que não há semelhança com modelos de terceiriza­ção também existentes no país. Na PPP, o Estado não investe na construção do presídio, liberando recursos públicos, sempre escassos, para áreas de saúde e educação.

O modelo mineiro prevê que a empresa responsáve­l seja permanente e minuciosam­ente avaliada, e sua remuneraçã­o depende da análise de 380 indicadore­s de desempenho que vão desde o número de presos que estudam e trabalham à qualidade da assistênci­a jurídica e de saúde, ao número de rebeliões e fugas e ao sistema de vigilância interna.

2017 nasceu banhado em sangue e vergonha. Não podemos aceitar que isso se repita. Tudo o que afronta a condição humana não nos serve. O Brasil que queremos tem a obrigação de reagir. Hoje, agora.

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