Folha de S.Paulo

Dois irmãos

-

Na Nova York de 1910, a família Gershwin, pobre, porém decente, comprou a prestações um piano de segunda mão para que o filho Ira, 14 anos, aprendesse a tocar. Mas Ira não ligava para música —só queria saber das palavras. Quem se apaixonou pelo instrument­o foi seu irmão George, 12. E, com isso, surgiu George Gershwin, que compôs um corpo de canções sem paralelo na música americana —“The Man I Love”, “Fascinatin’ Rhythm”, “Oh Lady Be Good”, “Love is Here To Stay”, “Embraceabl­e You”, “’S Wonderful”, “But Not For Me”, “Summertime” e muitas mais. E, claro, “Rhapsody in Blue”.

Na mesma Nova York, em 1928, Barbara Monk, viúva e ainda mais pobre, também comprou um piano para sua filha Marion, que levava jeito. Mas quem aprendeu a tocar, espiando sobre o ombro de Marion, foi o irmão dela, Thelonious, 11 anos. Sim, Thelonious Monk, no futuro o mais original pianista e compositor do jazz, autor de “Round Midnight”, “Epistrophy”, “Well You Needn’t”, “Evidence”, “Pannonica”, “I Mean You”, “Ruby, My Dear” etc.

Em 1940, no Rio, a professora Nilza Jobim comprou, idem, um piano, na esperança, ibidem, de que sua filha Helena, 9 anos, o assumisse. Mas quem se atracou com ele foi seu filho mais velho, Antonio Carlos, 13. O qual se tornou, naturalmen­te, Antonio Carlos Jobim, que, pela vida, nos brindou com “Se Todos Fossem Iguais a Você’, “Por Causa de Você”, “Chega de Saudade”, “Dindi”, “Garota de Ipanema”, “Samba do Avião”, “Ela é Carioca”, “Wave”, “Águas de Março” —você sabe.

Por acaso, em julho próximo teremos os 80 anos da morte de Gershwin; em outubro, os 100 de nascimento de Monk; e, neste 25 de janeiro, Jobim faria 90.

Mas o que interessa é: se quiser que um de seus filhos seja um prodígio musical, compre um piano para um deles —e fique de olho no outro. ANTONIO DELFIM NETTO

ideias.consult@uol.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil