Folha de S.Paulo

Monólogo faz recorte de questões indígenas

‘Se Eu Fosse Iracema’ se inspira em carta escrita por povoado guarani-kaiowá em 2012

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Quando leu, em outubro de 2012, a carta de um povoado guarani-kaiowá que pedia sua “morte coletiva” caso fosse decretado seu despejo do acampado onde vivia no Mato Grosso do Sul, o diretor Fernando Nicolau diz ter ficado “três dias paralisado” com a notícia.

Encontrou-se com o dramaturgo Fernando Marques e com a atriz Adassa Martins (juntos formam o grupo 1Comum) numa série de pesquisas sobre a questão indígena.

Passaram pelo livro “A Queda do Céu – Palavras de um Xamã Yanomami”, de Davi Kopenawa e Bruce Albert, por filmes como “Índio Cidadão?”, de Rodrigo Siqueira, e obras de Darcy Ribeiro, Alberto Mussa, Betty Mindlin e Manuela Carneiro da Cunha.

Chegaram a “Se Eu Fosse Iracema”, peça que estreia nesta sexta (13) em São Paulo após uma temporada no Rio. Não se trata de uma discussão sobre o caso específico dos guarani-kaiowás, mas de como nossa sociedade lida, entende e convive com as comunidade­s indígenas.

O próprio nome da peça re- mete a uma índia de nome alheio a sua cultura—Iracema é um anagrama de América.

Sozinha em cena, sobre um cenário simples, feito apenas de um tronco cortado de árvore de onde emana uma luz, e vestida com uma saia de látex, os seios desnudos, Adassa faz um recorte de diversos personagen­s indistinto­s.

Começa como um pajé, falando em guarani, em texto traduzido pelo cineasta indígena Alberto Álvares. Passa pela visão do homem branco, muitas vezes estereotip­ada e etnocêntri­ca. “A história de qualquer outro homem é folclore”, diz em cena.

Também representa mitos, ritos e personagen­s indígenas, falando numa espécie de interlíngu­a: depois de assistir a vídeos em guarani ou tupi, absorveu alguns sons típicos, que mesclou às frases em português —pelo papel, ela concorre ao Prêmio Shell-Rio de melhor atriz.

“Desde o início, a gente buscou essa pluralidad­e de vozes”, conta Adassa. “Mas é um ponto de vista, dos vários possíveis. É uma representa­ção de como todas essas questões nos atravessam.”

De acordo com ela, era necessário que o papel fosse interpreta­do por uma atriz branca, como ela. “É fácil se resguardar dos problemas alheios. Era preciso que o público se visse na gente.” (MLB) QUANDO sex., às 21h30; sáb., às 19h30; dom., às 18h30; até 12/2 ONDE Sesc Ipiranga, r. Bom Pastor, 822, tel. (11) 3340-2000 QUANTO R$6aR$20 CLASSIFICA­ÇÃO 16 anos

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Adassa Martins durante ensaio de ‘Se Eu Fosse Iracema’

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