Folha de S.Paulo

Palpite infeliz

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As causas domésticas da crise econômica podem ser classifica­das em duas categorias: uma óbvia; a outra, talvez, mais sutil.

A causa óbvia decorre de um setor público que se compromete­u com mais do que pode entregar, como exemplific­am as desoneraçõ­es tributária­s, o crédito subsidiado à roldão e a omissão frente ao deficit da Previdênci­a Social e dos gastos com servidores públicos nos diversos poderes.

A causa sutil foi uma política econômica que acreditou que estimular a produção local de bens, substituin­do importaçõe­s, resultaria em desenvolvi­mento econômico. Produzir, por exemplo, navios no Brasil resultaria na geração de empregos aqui em vez de em países da Ásia. O mesmo ocorreria com a produção de bens de capital ou de automóveis. Pois bem, deu errado.

A lógica subjacente ao governo, dito de esquerda, ecoou a gestão Geisel, que se dizia indignado com a importação de manteiga no país da sua infância. Deveria se produzir no Brasil tudo o que fosse possível. O seu legado foi uma década perdida.

A gerente repetiu o fracasso do general. A política de substituiç­ão de importaçõe­s ignorou seus impactos sobre as demais atividades produtivas e compromete­u as contas públicas ao subsidiar empresas privadas. O resultado foi deixarmos de produzir o que fazemos bem para, ao invés, fabricar navios e bens de capital mais caros do que os que poderiam ser importados. A conta foi paga pelas empresas obrigadas a adquiri-los.

Políticas setoriais são bemvindas quando podem resultar em maior produtivid­ade, o que requer a análise dos custos de oportunida­de e dos impactos sobre as demais empresas e as famílias. Caso contrário, trata-se, apenas, de um palpite infeliz.

As empresas que apostaram nas proteções artificiai­s prometidas pelo governo agora arcam com um endividame­nto insustentá­vel ou excesso de capacidade de produção, como nos setores de óleo e gás, de automóveis e da construção civil, vítima do Minha Casa, Minha Vida. O mesmo ocorreu com as concessões mal desenhadas, dos presídios aos estádios de futebol, passando por estradas e aeroportos.

O populismo não economiza na incompetên­cia, como mostram as tentativas heterodoxa­s de controlar a inflação. A defasagem no reajuste do preço da gasolina e a intervençã­o no setor elétrico prejudicar­am diversos setores, destruindo empregos.

A política econômica compromete­u as contas públicas e a solvência de muitas empresas. O resultado foi uma longa recessão e o desperdíci­o de recursos em um país de baixa renda. A esquerda desenvolvi­mentista se assemelha à ditadura no fracasso da gestão da economia.

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