Folha de S.Paulo

Doria, não perca o foco no ônibus

- LEÃO SERVA COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Leão Serva; terça: Rosely Sayão; quarta: Francisco Daudt; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Oscar Vilhena Vieira; domingo: Antonio Prata

ENTRE TANTOS problemas neste início de ano, uma boa notícia foi o custo do congelamen­to da tarifa de ônibus na cidade de São Paulo: R$ 400 milhões, anunciou a administra­ção municipal ao concluir o cálculo da despesa de manter o preço do bilhete único até o fim de 2017.

Se você se lembra, a administra­ção Haddad, a Câmara Municipal e outros descontent­es anunciaram que a promessa, feita pelo prefeito Doria logo após a eleição, custaria entre R$ 1 bi e R$ 1,2 bilhão. Bem menor, o valor anunciado é metade da economia que pode ser obtida com a eliminação de cobradores.

Há muitos interesses contrariad­os pela manutenção da tarifa de ônibus de São Paulo: do PT (gostaria que Haddad tivesse congelado a tarifa, mas ele não o fez); outros prefeitos da Região Metropolit­ana (cujo assalto ao contribuin­te fica evidente quando a maior cidade tem a menor tarifa); empresário­s que exploram ônibus nas cidades onde não há subsídio à passagem (temem congelamen­tos semelhante­s); e o sempre biruta Movimento Passe Livre (ataca a administra­ção que congela tarifa e preserva as que aumentam, mesmo de esquerda); entre outros que pouco se lixam com o usuário de transporte­s públicos.

Há ainda o Poder Judiciário, que invade competênci­as do Executivo em busca de “proativida­de”.

De todas as missões da administra­ção paulistana, nada é tão essencial ou urgente quanto os transporte­s públicos. As prioridade­s da administra­ção Doria devem ser: ônibus, ônibus e ônibus, “não necessaria­mente nessa ordem” (como gostam de brincar os jornalista­s)... As urgências: 1) há uma licitação em curso, iniciada por Haddad, para implantar uma nova rede com novidades boas, mas também vários problemas, como o tempo de vigência (20 anos renováveis por mais 20), que o Tribunal de Contas do Município (TCM) exige reduzir. Doria deve resolver logo os defeitos para liberar a licitação, reduzir custos e melhorar a qualidade do sistema;

2) em seguida deve se dedicar a acelerar a implantaçã­o de corredores de ônibus, que têm uma evolução sempre lenta nesta cidade. O prefeito Haddad, que prometeu inaugurar 150km, terminou o mandato com cerca de 35km, iniciados pelo antecessor, Gilberto Kassab. Os processos travaram na resistênci­a de comerciant­es e moradores; em problemas com desapropri­ações e questionam­entos do TCM. A Prefeitura precisa garantir um fluxo mais rápido para esses projetos para melhorar o desempenho dos coletivos e reduzir custos (ônibus mais velozes permitem a redução de veículos sem prejuízo para o usuário).

3) Eliminação dos cobradores: como jabuticaba, essa função só existe no Brasil; no resto do mundo, a tecnologia tornou desnecessá­ria, como ascensoris­tas e telefonist­as. O custo desses funcionári­os é cerca de R$ 800 milhões/ano, duas vezes o do congelamen­to.

Por fim, o novo prefeito poderá adotar uma medida de impacto, que depende de extrema ousadia política: o pedágio urbano, sempre impopular no início (os usuários de carros se sentem lesados e esperneiam). A receita deve ser usada integralme­nte para subsidiar o Bilhete Único e aumentar a rede de transporte­s públicos.

Com essas medidas, em pouco tempo a cidade deve ter, realmente, uma mobilidade digna de Primeiro Mundo, como São Paulo gosta de ser.

Boa notícia: congelamen­to custará menos; agora é preciso focar em qualidade e, talvez, pedágio urbano

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