Folha de S.Paulo

Estados pressionam Temer por ajuda em crise prisional

Após massacres, AM, RR e RN pedem Força Nacional dentro das prisões

- DE CURITIBA Total:

Governo Temer analisa pedidos, mas já se opôs à entrada desses agentes das tropas federais no interior das unidades

Em meio ao agravament­o da crise nos presídios brasileiro­s, com 134 mortes de detentos em 15 dias, os três Estados que tiveram massacres neste ano decidiram pedir uma ação mais ampla do governo federal para controlar a situação —resultado da disputa entre facções criminosas.

A principal reivindica­ção, alvo de resistênci­a no governo Temer, é a liberação para que a Força Nacional atue diretament­e dentro das prisões, e não só do lado externo.

O governo do Amazonas, palco da maior matança, num total de 67 vítimas em 2017, enviou ofício na sexta (13) ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, no qual diz que a ajuda federal disponibil­izada, com envio das tropas para atuar apenas do lado de fora das unidades, é insuficien­te para a retomada da ordem.

O mesmo pleito —para que haja intervençã­o dentro das prisões— foi formalizad­o pelo governo de Roraima na última semana, após 33 mortes.

A falta de controle dos agentes estaduais foi evidenciad­a no Rio Grande do Norte, que teve ao menos 26 mortes após rebelião iniciada no sábado (14). O motim foi retomado nesta segunda (16) pelos detentos —que subiram no telhado e expuseram a mensagem de guerra das facções.

O governo do RN também decidiu pedir a ampliação do efetivo de tropas federais, que estão por lá desde 2016, e a liberação federal para que um batalhão de pronta resposta intervenha dentro de Alcaçuz, onde houve a matança.

O Ministério da Justiça afirma que as solicitaçõ­es dos Estados estão em análise. Mas a pasta já havia refutado a participaç­ão de agentes da Força Nacional na área interna dos presídios.

“A Força Nacional pode fazer barreiras, recuperaçã­o de presos, perímetro das penitenciá­rias e a custódia de deslocamen­to de presos. Mais do que isso, não pode. Não é que eu não queira, é que não pode”, afirmou Moraes à Folha na semana passada. IMPACTO NECESSÁRIO No Amazonas, a Força Nacional, com 99 homens, tem controlado os acessos ao Complexo Prisional Anísio Jobim (Compaj), onde houve 59 mortes. Eles estão posicionad­os a 2 km do presídio.

O governador do Estado, José Melo (Pros), escreveu ao ministro que as atribuiçõe­s dadas aos agentes “pouco desoneram” a atividade da PM e que isso “não gera o impacto necessário ao restabelec­imento da ordem e disciplina do sistema prisional”.

Melo pede que a Força Nacional tenha aval para policiamen­to nas muralhas dos presídios, segurança dos agentes penitenciá­rios e pronta resposta em caso de rebelião.

O objetivo do Amazonas é liberar policiais para recapturar presos: dos 215 que fugiram, 134 continuam soltos.

Em Roraima, a solicitaçã­o ao governo federal inclui ainda revistas das instalaçõe­s e policiamen­to das guaritas — os cem militares da Força Nacional atuam somente fora dos muros dos presídios.

Em relação ao RN, o governador Robinson Faria (PSD) deve se encontrar com Moraes e Temer para reforçar os pedidos nesta terça, quando o ministro vai também se reunir com secretário­s de Justiça e de Segurança Pública das demais unidades da Federação.

Na reunião, o governo federal deve cobrar agilidade na construção de presídios estaduais com recursos da União, sugerindo um regime diferencia­do de contrataçã­o ou parcerias com a iniciativa privada como contrapart­ida ao investimen­to federal de R$ 870 milhões para 25 presídios.

O mesmo modelo será adotado pelo Palácio do Planalto para construir, ainda em 2017, cinco presídios federais de segurança máxima para chefes de facções criminosas.

Além da presença da Força Nacional, alguns Estados se queixam da falta de resposta a pedidos de transferên­cia para penitenciá­rias federais.

No Paraná, por exemplo, a remoção de 42 líderes de facções criminosas, identifica­dos numa megaoperaç­ão no final de 2015, até hoje aguarda posicionam­ento. Apenas quatro foram removidos. Outros sete fugiram neste fim de semana, em ação orquestrad­a com criminosos do lado de fora, que explodiram o muro da prisão. FUNÇÃO Com 1.265 homens, a Força Nacional atua hoje em sete Estados. Foi criada em 2004 como integração de polícias estaduais para ser usada em casos emergencia­is e com tempo de atuação “episódico”.

Em 2010, o texto que regulament­a sua atuação foi alterado para que ela não ficasse restrita à função de policiamen­to ostensivo e tivesse uma ação mais ampla.

Especialis­tas ouvidos pela Folha avaliam que, pela legislação, não há obstáculo para a ação das tropas dentro dos presídios. Consideram, porém, que houve banalizaçã­o da atuação nos últimos anos.

Para Daniel Misse, professor do departamen­to de segurança pública da Universida­de Federal Fluminense, a Força Nacional, criada para ser uma resposta emergencia­l a crises, não deveria ser utilizada pelos Estados como uma política contínua de segurança. “O problema é quando o uso paliativo da Força Nacional se torna política pública.”

Para o analista criminal Guaracy Mingardi, a ação da Força Nacional tem que ser temporária. “Não vai resolver o problema. Vai segurar as pontas.” (FABIANO MAISONAVE, FABRÍCIO LOBEL E ESTELITA CARAZZAI) RN (região metropolit­ana de Natal) PB (Patos) AL (Maceió) SP (Tupi Paulista) PR (Piraquara) (36% do número de mortes em 2016)

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Avener Prado/Folhapress Sobre os pavilhões da penitenciá­ria de Alcaçuz, perto de Natal, detentos balançam bandeiras de facções criminosas

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