LUZ E TREVAS
Arquiteto Jean Nouvel se divide entre inovação e dependência das grandes fortunas em obras como o Louvre árabe
Jean Nouvel é um homem pálido, quase um boneco de cera que se veste todo de preto. Mas ele não tem medo de derreter. Nos últimos anos, esse francês que é um dos arquitetos mais famosos do mundo não tirou a cara do sol.
Suas novas construções se espalham por cidades de clima quente, quando não tórrido. Nouvel está construindo um hotel de luxo em São Paulo, um prédio de apartamentos em Miami e inaugura no fim do ano a que talvez seja sua obra mais faraônica —a filial do Louvre em Abu Dhabi.
Uma espécie de tenda armada no deserto rodeada pela água azul-turquesa do golfo Pérsico, a filial do museu parisiense na capital dos Emirados Árabes Unidos será o primeiro de uma série de projetos grandiosos a ganhar vida na ilha de Saadiyat, um delírio urbanístico que se desenha como o último suspiro da era dos “starchitects”.
Na crista da onda da bonança dos petrodólares há uma década, arquitetos como ele, Norman Foster, Zaha Hadid e Frank Gehry foram convocados para ver quem faria ali o desenho mais espalhafatoso.
Enquanto a fonte financeira secou com a crise econômica e obras como o Guggenheim árabe, de Gehry, sofreram com escândalos de abusos de direitos trabalhistas, Nouvel não desistiu e será o primeiro deles a cristalizar um projeto que se pretende diáfano como uma miragem.
O grande trunfo do novo Louvre, que custou R$ 2 bilhões e a vida de pelo menos um operário, é a imensa cobertura translúcida, que filtra a luz solar, transformando o dia lá fora em tempestade de raios luminosos do lado de dentro das galerias.
Essa visão fantástica é realçada pelo espelho d’água natural. Barreiras em torno do canteiro de obras acabam de ser removidas, permitindo o avanço do mar que agora lambe as paredes brancas do museu, quase uma pérola ostentada pelos sultões.
“Os países da região vivem uma era de ouro agora, então é normal que eles queiram prédios grandiosos”, diz Nouvel, que se sentou para falar à Folha em Miami, onde lançava outro edifício de luxo. “Todos os grandes países e grandes cidades do mundo viveram suas eras de ouro e fizeram coisas extraordinárias.”
Nouvel vem seguindo o ouro. Após flertar com obras de habitação social na década de 1980, o vencedor em 2008 do Pritzker, maior prêmio mundial da arquitetura, foi se firmando no plano global com obras espetaculares, talhadas para milionários.
Seu sucesso estrondoso joga luz sobre como a inovação arquitetônica depende cada vez mais das grandes fortunas, o lado mais sombrio da chamada arquitetura de autor.
O hotel que constrói em São Paulo, por exemplo, terá um “caviar lounge”. Em Nova York, outra torre que ergue perto do MoMA tem apartamentos de R$ 226 milhões à