Folha de S.Paulo

CRÍTICA Série ‘Minha Luta’ perde força no 4º volume

Saga autobiográ­fica do escritor norueguês Karl Ove Knausgård fica meio maçante em ‘Uma Temporada no Escuro’

- CAMILA VON HOLDEFER

FOLHA

Destaque da Flip do ano passado, Karl Ove Knausgård provavelme­nte já está habituado a ser o centro das atenções. Sua escrita sedutora (e reveladora) tem levado leitores de diversos países a acompanhar os volumes da saga autobiográ­fica “Minha Luta”.

O quarto dos seis volumes, “Uma Temporada no Escuro”, saiu quando de sua passagem pelo Brasil. Nele, com a franqueza costumeira, o autor retrata um período nebuloso: a transição, na década de 1980, da adolescênc­ia para uma espécie de zona intermediá­ria antes da maturidade.

Aos 18 anos, depois de concluir o colegial, Knausgård parte para Håfjord, um vilarejo no norte da Noruega, onde arranja um emprego de professor. A ideia é lecionar durante parte do dia e, na solidão da cabana alugada, escrever ficção. Num povoado minúsculo, porém, privacidad­e e isolamento são conceitos voláteis.

Knausgård, por sua vez, deseja a solidão tanto quanto deseja uma companhia. Ele nunca fez sexo —o que o preocupa. Basta o vislumbre de um par de seios para que ele perca a compostura.

Enquanto ele mesmo se transforma, Knausgård acompanha a transforma­ção dos estudantes. Com a pequena diferença de idade entre um e outros, o que se estabelece é uma estranha relação professor-alunos —sobretudo professor-alunas.

Mesmo se retrata uma fase turbulenta, o livro tem algo de engraçado.

De um lado, há um jovem aspirante a escritor às voltas com a dificuldad­e de encontrar a própria voz numa narrativa. De outro, há um jovem aspirante a escritor que sofre de ejaculação precoce.

Karl Ove também retrocede aos últimos anos do colegial, marcados por conflitos e interesses semelhante­s — garotas, bebida, discos. Até certo ponto, ele encontra na música uma válvula de escape para seus impulsos conflitant­es. Se a música não pode ajudá-lo, o álcool o ajuda. Ele ao menos acha que sim.

Mesmo com todo o talento de Knausgård para fisgar o leitor, não deixa de ser um tanto monótono acompanhar as desventura­s de um adolescent­e cheio de hormônios.

A banalidade, que antes era atraente, aqui se torna meio maçante. Karl Ove não encontra uma cueca limpa depois de um episódio de polução noturna. Karl Ove disfarça uma ereção inoportuna. Karl Ove bebe com os amigos. Karl Ove bebe com os amigos. Karl Ove bebe com os amigos.

Apesar de se manter razoavelme­nte interessan­te, a série perde a força. Não há como negar que, dos quatro livros publicados no Brasil até agora, “Uma Temporada no Escuro” é o mais fraco. AUTOR Karl Ove Knausgård TRADUÇÃO Guilherme da Silva Braga EDITORA Companhia das Letras QUANTO R$ 59,90 (496 págs.) AVALIAÇÃO bom

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil