Folha de S.Paulo

Principais países da Europa atacam protecioni­smo e tom nacionalis­ta

François Hollande condena restrições ao comércio; vice-premiê alemão espera ‘tempos difíceis’

- ANNA VIRGINIA BALLOUSSIE­R

Britânicos temem fim da proteção e México é cauteloso; em meio a protestos no mundo, russos fazem festa

O tom nacionalis­ta e as alusões ao protecioni­smo comercial de Donald Trump alimentara­m críticas das principais economias da Europa ao novo presidente e deixaram apreensivo­s os países virtualmen­te prejudicad­os no governo do republican­o.

Sem citar o nome do colega, o presidente da França, François Hollande, disse que não é possível e desejável que um país se afaste da economia mundial, em referência ao desejo do americano de priorizar a indústria local.

“Fechar as fronteiras como recomendam alguns, entre os quais o que presta julgamento em Washington, que quer impor taxas ou direitos para impedir a entrada de produtos, equivale a por em questão o trabalho”, disse.

O vice-primeiro-ministro alemão, Sigmar Gabriel, alertou que o mundo deve se preparar para “tempos difíceis nos próximos anos”. “O que ouvimos foi um tom fortemente nacionalis­ta. É um discurso extremamen­te sério.”

Tanto Hollande quanto Gabriel fazem alusão ao futuro dos próprios países: a França escolhe seu presidente em abril e a Alemanha vai às ur- nas para eleger o novo Parlamento em setembro. Em ambos, os governos enfrentam dificuldad­es e há o risco de avanço da extrema direita.

Para o ministro do Tesouro britânico, Philip Hammond, a posse de Trump é um “grande problema” para a Europa, principalm­ente na defesa. O republican­o considera a Otan obsoleta e no discurso de posse disse que priorizará os recursos militares para proteger os americanos.

“Qualquer coisa que mude a situação da Europa, que é vizinha da Rússia, mas vive sob a proteção dos EUA, altera as dinâmicas da União Europeia”, disse Hammond.

O papa Francisco pediu ao novo presidente que defenda a dignidade humana “num mundo imerso em graves crises humanitári­as”. Durante a campanha, o pontífice criticou o americano pela proposta de construir um muro na fronteira com o México e barrar a entrada de muçulmanos nos Estados Unidos.

A prioridade do novo governo à produção nacional fez com que México e Japão agissem com cautela. O mexicano Enrique Peña Nieto disse que a proteção de seus concidadão­s será prioridade.

“A soberania, o interesse nacional e a proteção dos mexicanos guiará nossa relação com o governo dos EUA.”

O premiê japonês, Shinzo Abe, disse que a relação com Washington “é um princípio imutável” e prometeu visitar Trump nos próximos meses.

A China, principal alvo das críticas de comércio exterior de Trump, não havia se manifestad­o até a conclusão desta edição. Na terça (17), o presidente Xi Jinping atacou o agora colega americano e defendeu o livre-comércio.

Nobel da Paz pelo acordo com as Farc, o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, pediu que Trump volte seus olhares para a América Latina, pois aqui é que estão os verdadeiro­s interesses estratégic­os dos EUA”.

Apesar do pedido, a política para os vizinhos do sul continua sendo uma incógnita. O governo brasileiro não havia se manifestad­o até a conclusão desta edição. FESTA Enquanto milhares de pessoas protestava­m contra Trump nas ruas de Washington, Londres e Berlim e quebravam piñatas do republican­o em frente a símbolos americanos no México, o clima na capital do antagonist­a histórico dos EUA era de festa.

Cerca de cem nacionalis­tas russos estouraram champanhe em uma boate de Moscou assim que o republican­o assumiu. Eles esperam que, com o novo governo, a situação do país melhore.

Na festa havia bonecos de Trump, do líder russo, Vladimir Putin, e da francesa Marine Le Pen, a próxima aposta da direita para assumir um governo que hoje é liberal.

DE SÃO PAULO

Mike Pence prestou juramento para se tornar o novo vice-presidente dos EUA pondo a mão sobre uma antiga Bíblia de Ronald Reagan.

Foi graças ao ex-presidente que ele, outrora um democrata que guardava memorabili­a de John Kennedy numa caixa, mudou de lado. “Seus ideais me inspiraram”, disse o republican­o em setembro.

Governador de Indiana até se integrar à chapa de Trump, Pence, 57, já se apresentou como “um cristão, um conservado­r e um republican­o, nessa ordem”. “Eu era do Tea Party antes de isso virar moda”, disse em 2011, expondo sua afeição pelo movimento ultraconse­rvador. Criado como católico, o vice se converteu evangélico num festival de música cristã no Kentucky, em 1978. “Entreguei minha vida a Jesus Cristo, e isso mudou tudo”, contou à NBC em 2010.

Suas crenças influencia­ram decisões políticas. Deputado por 12 anos, tem histórico de votos antiaborto e anti-LGBT.

“O colapso social sempre se seguiu à deterioraç­ão da família”, disse em 2006, ao advogar contra o casamento gay.

Em 2000, elegeu “Titanic” como metáfora dos nossos tempos. Comparou a partida do navio que iria a pique, “com passageiro­s orgulhosos dando ‘tchau’”, com os EUA “se distancian­do do porto seguro da nossa melhor moral”. Concluiu: “Há icebergs pela frente e nós sabemos disso”.

Pence ganhou projeção nacional ao sancionar em 2015 uma lei de liberdade religiosa que. na prática, permitia a negócios locais rejeitar clientes gays —desistiu após empresas ameaçarem boicotar Indiana.

Trump não foi sua primeira escolha nas prévias republican­as, e sim outro evangélico, Ted Cruz. “Mesmo que ele estivesse sob pressão, porque sou tão de fora do establishm­ent, foi o melhor nãoapoio que eu tive na vida”, disse o empresário depois.

Na campanha, o vice agiu como bombeiro do mais abrasivo presidenci­ável da história moderna americana. Pence enviava mensagens protocolar­es para acalmar colegas nervosos com o candidato, que atacava caciques republican­os.

Como vice, Pence preside também o Senado e é um dos articulado­res da Casa Branca com o Congresso. Em agosto, um garoto de 11 anos o questionou em ato na Carolina do Norte: “Notei que você meio que suaviza palavras do sr. Trump. Esse será seu papel na administra­ção?”. Pence riu.

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Daniel Leal-Olivas/AFP Manifestan­tes carregam cartazes acusando Donald Trump de racismo e fascismo em protesto em frente à embaixada dos EUA de Londres nesta sexta
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John MacDoughal­l/AFP Ativistas contrários a Trump realizam protesto no Portão de Brandembur­go, em Berlim

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