Uma trapaça da sorte
Continuar o trabalho de mudar o patamar ético do Brasil será a forma mais digna de homenagear o ministro Teori Zavascki
É muito difícil fugir do lugar comum nos momentos de perdas trágicas. A impermanência é o símbolo maior da nossa humanidade. A morte, a única certeza plena dessa vida.Podeaconteceraqualquerum, a qualquer momento. Mas nunca é hora. O Brasil, o Supremo e os amigos não estavam preparados para viver sem Teori Zavascki.
Subitamente, nos demos conta de como precisávamos dele. Discreto, avesso a holofotes, Teori ficaria imensamente incomodado com a comoção que causou e a atenção que está recebendo.
Não foram poucas as decisões emblemáticas que passaram por suas mãos em tempos recentes. Entre elas, a possibilidade de execução da pena após a condenação em segundo grau; o afastamento da presidência da Câmara dos Deputados de parlamentar sob acusações graves; a prisão de um senador da República acusado de interferir com investigação em curso. Para citar as que tiveram mais visibilidade.
O Brasil vive um momento difícil e grave. Parece haver uma conspiração de circunstâncias negativas. Mas é possível, também, interpretar os acontecimentos como uma virada histórica na direção de um país melhor e maior.
Teori tinha essa percepção, e supervisionava a Operação Lava Jato aristotelicamente: com virtude, razão prática e coragem moral. Continuar o trabalho de mudar o patamar ético do Brasil, com a mesma determinação e serenidade, será a forma mais digna de homenageá-lo.
Teori foi também um professor de primeira linha, que ensinou por muitos anos na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e produziu alguns livros clássicos. Há poucos meses, por insistência minha, ele havia se integrado ao Programa de Pós-Graduação do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), onde lecionaríamos juntos. Também lá fará uma falta imensa.
Enfim, caberá ao noticiário enumerar os fatos da sua vida pública e de sua trajetória como magistrado e acadêmico. Aproveito o espaço que resta para um breve depoimento pessoal.
Éramos amigos próximos, mas recentes. Fomos nomeados para o Supremo Tribunal Federal com poucos meses de distância. Antes de virar juiz, estive despachando com ele diversas vezes, postulando direitos que me pareciam legítimos.
Admirava-o tanto pela cortesia e consideração com que tratava advogados anônimos quanto pela nossa fraterna e espirituosa convivência no Tribunal. A gente na vida ensina sendo. Teori Zavascki era um bom exemplo disso.
Teori tinha a simplicidade das pessoas profundas. O senso de humor de quem é verdadeiramente sério. A desafetação intelectual de quem sabe bem do que está falando. Amigo é a pessoa com quem você pode simplesmente ficar calado, contar uma derrota ou chorar mágoas. Seguro de ouvir uma palavra de alento de um interlocutor de boa-fé.
Teori era mais de prudências do que de ousadias. Mais de tradições doquedemodernidades.Talvez,por isso mesmo, de uma forma dialética e afetuosa, nos completávamos.
Não faz muitas semanas que eu disse a ele, em plenário: “O país teve muita sorte de tê-lo como relator da Lava Jato”. Com o estilo de sempre, e um sorriso maroto, respondeu: “Quem não teve sorte fui eu”. Olhando agora, a constatação é inevitável: nenhum de nós teve.
Sentado em um restaurante longe de casa, devastado de tristeza, a comida esfriando na minha frente, escrevo essas palavras como quem chora. Com tinta, em vez de lágrimas. Ajude-nos aí de cima, amigo. LUÍS ROBERTO BARROSO,
A nomeação do substituto de Teori Zavascki remete a uma questão recorrente: já passou da hora de alterar a forma de provimento no STF, tirando-a do livre arbítrio do Executivo. O correto, institucional e republicano seria a indicação a partir de um colegiado formado por Ministério Público Federal, Justiça Federal, Advocacia-Geral da União e OAB.
LAFAYETTE PONDÉ FILHO
A nomeação de Sergio Moro para o STF, defendida por alguns, constituirá um sedativo aplicado na Lava Jato, na medida em que não basta ser ele nomeado, mas que também herde a relatoria, o que é duvidoso. Além disso, é provável que a eficiente e dinâmica atuação até agora demonstrada nos julgamentos sofra indesejável solução de continuidade, em virtude da incerteza sobre seu substituto. O bom senso indica que Moro permaneça, nesse momento crítico, em seu posto.
PAULO ROBERTO GOTAÇ
Donald Trump É incrível que o discurso autoritário, intolerante e irresponsável de Donald Trump esteja encontrando tantos defensores. Já sabemos qual foi, num passado recente, a consequência desse tipo de postura. Então a história não serve para nada? É o tempo dos brutamontes.
LEANDRO VEIGA DAINESI
Relendo o discurso de posse de Trump, percebemos analogia com a “boa nova” do evangelho pregado por Jesus Cristo. As promessas foram tantas que, para nós, céticos em políticos à brasileira, só milagres poderiam vertêlas em realizações. Veremos.
HILÁRIO COUTINHO
Colunistas Uma conclusão alternativa sobre a brilhante coluna de Laura Carvalho (“Bem-estar social ou barbárie”, “Mercado”, 19/1): enquanto o sistema previdenciário continuar cada vez mais insustentável em meio à elevação da expectativa de vida, não teremos recursos para os programas sociais, para o sistema penitenciário, para educação e para saúde. Escolhemos gastar o que não temos e nos financiarmos a juros elevados pra controlar uma inflação oriunda de uma dominância fiscal perniciosa falida.
BRUNO PREZA
Sobre a coluna de Reinaldo Azevedo (“É a democracia, estúpidos”, “Poder”, 20/1), será que entre a “estupidez da esquerda e da direita” existe alguém que discorde da hipótese de que abrimos mão do “padrão mínimo de civilidade” quando nos tornamos o último país a libertar escravizados? E ainda hoje somos uma “democracia” com a maior desigualdade do mundo? A meu ver está aí a maior causa da violência. Apenas construir presídios é formar mão de obra barata.
JESUÍNO BORGES DE CARVALHO,
Reinaldo Azevedo escreve sobre a crise carcerária. Tenta se fazer de civilizado, mas logo mostra a cara: quer que o Brasil prenda ainda mais gente. Ele diz que esquerdistas não têm proposta para o problema. Claro que têm: parar de prender à toa e libertar presos que já cumpriram pena. E parar de prender usuários de drogas como se fossem traficantes. Isso enquanto não acaba esse proibicionismo estúpido que criou todo esse problema de segurança pública no Brasil.
TÂNIA CRISTINA DE MAURO CUNHA