Folha de S.Paulo

ANÁLISE País será menos prejudicad­o que outros por protecioni­smo

- MATIAS SPEKTOR

FOLHA

Donald Trump inaugura um período de incertezas para o Brasil. Não tanto pela retórica bombástica ou pelo flerte irresponsá­vel com o protecioni­smo. Afinal, o novo presidente não é um ideólogo, mas um negociador que usa ameaças e intimidaçã­o para arrancar aquilo que quer de seus interlocut­ores.

O problema são os potenciais efeitos não-intenciona­is desse estilo presidenci­al. Mesmo sem querer, Trump pode dar ainda mais força à onda populista na Europa, induzir um choque comercial descontrol­ado com a China ou empurrar o México para o precipício, todas coisas ruins para o Brasil.

O país, no entanto, deve ser menos prejudicad­o do que outros países. Como exportamos poucos manufatura­dos para os Estados Unidos, o aumento de barreiras nos machuca menos.

Tampouco há grandes questões pendentes: o malestar da espionagem foi esquecido, e a imigração brasileira para os Estados Unidos não figura no radar.

Por esses motivos, o governo Temer quer lidar com Trump por meio de uma agenda de resultados econômicos. O desafio é mostrar à nova equipe em Washington que há oportunida­des de ganho concreto.

O cardápio de opções é vasto. A área mais evidente é a indústria de defesa e segurança. Existe no Brasil consenso a respeito da necessidad­e de assinar um acordo de salvaguard­as com os Estados Unidos que permita reativar a base de lançamento­s de foguetes em Alcântara (MA). Há interesse mútuo em consolidar a cooperação iniciada entre Polícia Federal e FBI durante a Copa e as Olimpíadas.

E o setor privado tem o que mostrar. Boeing e Embraer trabalham juntas com êxito. A Braskem acaba de abrir uma fábrica no Texas.

Onde há pouca chance de avanço é na área de bitributaç­ão, que onera a relação bilateral. Aí, seria necessário um esforço coordenado entre Trump e Temer para eliminar resistênci­as. As chances disso acontecer, contudo, são pequenas. CONGRESSO Seja como for, operar a nova Washington de Trump demandará do Brasil competênci­as e habilidade­s nas quais sempre fomos mal.

Uma delas é o trabalho de influência junto ao Congresso americano, onde têm representa­ção os interesses econômicos mais fundamenta­is. Falta interlocuç­ão de alto nível e promoção eficiente da marca Brasil.

Outra é o trabalho de lobby de agentes privados brasileiro­s na capital americana.

O esforço que existe hoje é valioso, mas ainda quase minúsculo quando comparado ao de países bem menores e mais pobres. É o tipo de coisa que é fácil de reverter, pois há modelos bons para a gente se inspirar.

 ?? Claudio Belli - 11.mar.2015/Valor ?? Soja é carregada no porto de Itaqui (MA); exportação agrícola não deve sofrer com Trump
Claudio Belli - 11.mar.2015/Valor Soja é carregada no porto de Itaqui (MA); exportação agrícola não deve sofrer com Trump

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil