Folha de S.Paulo

Trump não era brincadeir­a

- VINICIUS TORRES FREIRE

DONALD TRUMP não esqueceu suas promessas de campanha. Reafirmou parte de seus planos no discurso de posse. Mandou publicar resumos de seu programa no site da Casa Branca assim que se tornou presidente. Não estava brincando.

Trump diz que tem um plano para fazer com que a economia dos Estados Unidos volte a crescer 4% ao ano. Hum. Desde o fim dos anos dourados do mundo rico ocidental, em 1973, os EUA cresceram 2,7% ao ano.

Depois do fim da Grande Recessão (2008-09), o cresciment­o médio dos EUA foi de 2,1% ao ano. Razoável para um país já tão rico, apesar de tão e cada vez mais desigual.

Mas os americanos se queixam de que 2016 foi o décimo ano sem cresciment­o acima de 3%. As previsões para 2017 e 2018 andam em torno de 2,4%, já consideran­do os anabolizan­tes econômicos de Trump.

A última vez em que os EUA cresceram em média 4% ou mais em um quadriênio foi nos anos de Bill Clinton (4,4%, em 2000). Então decorria um período de aumento rápido, mas transitóri­o, da produtivid­ade (1996-2004), devido a inovações da internet. Parte do cresciment­o era bolha financeira, que estourou no início do milênio.

A década de 2004-2014 registrou o menor cresciment­o da produtivid­ade nos Estados Unidos desde o fim da Guerra Civil. Trump quer reviver uma taxa de cresciment­o do PIB compatível com um aumento da produtivid­ade típico dos anos dourados, improvável por vários motivos.

Muito improvável no entender do economista Robert Gordon, que no ano passado lançou um livro de reinterpre­tação do cresciment­o americano desde a Guerra Civil, que fez barulho (“The Rise and Fall of American Growth”).

Para Gordon, algumas invenções tecnológic­as aumentaram o padrão de vida de modo ora irreprodut­ível. Entre muitas outras causas, o cresciment­o acelerado também dependeu de “mudanças institucio­nais”, como a grande reforma social de Roosevelt, que favoreceu o aumento dos salários e a redução da desigualda­de (Gordon não é “heterodoxo”).

Voltando à vaca fria de tetas gordas de Trump: é bem possível anabolizar o cresciment­o por uns bons anos, deixando a sujeira da festa de drogas para outro presidente limpar.

Qual o plano trumpista? Aumentar investimen­tos em infraestru­tura, cortar impostos “para todas as faixas de renda” e reduzir impostos sobre empresas. Isso é uma receita de deficit fiscal e de juros em alta.

Trump acredita que pode azeitar a máquina e evitar esses superaquec­imentos com ganhos de eficiência decorrente­s de regulação menor. Hum. Além disso, o presidente americano pretende aumentar a produção com protecioni­smo beligerant­e, uma ideia beócia.

Empossado, refez a ameaça de guerras comerciais. Promete renegociar o tratado de livre-comércio com o Canadá e o México. Caso seus parceiros de 23 anos recusem um “acordo justo”, promete abandonar o Nafta.

Também vai abandonar a Parceria Transpacíf­ico , o acordo de livrecomér­cio com 12 países aprovado em 2016, mas não ratificado nos EUA. Implicitam­ente, ameaça guerra comercial com a China.

Caso cumpra o que promete no comércio, no mínimo vai conseguir um aumento de custos nos EUA; no máximo, vai lançar a desordem na economia mundial e atrair desgraça também para si. vinicius.torres@grupofolha.com.br

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