Folha de S.Paulo

‘Sherlock’ amadurece em 4ª temporada

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É RARA a série que se aprimora após começar bem e escorregar. Mas, após um decepciona­nte terceiro ano e uma reestreia titubeante, isso acontece com “Sherlock”, cuja nova leva de episódios acaba de ser exibida no Reino Unido e nos EUA —e pode ser a última.

Não havia, até a conclusão deste texto, confirmaçã­o de que o drama sobre o detetive criado por Arthur Conan Doyle no século 19 fosse retornar às telas pela quinta vez (no Brasil, a Netflix dispões das três primeiras e não divulgou data para a atual).

A possibilid­ade foi deixada aberta pelos produtores e pelo elenco em entrevista­s nos últimos dias, mas nenhuma data aparece no horizonte. A quarta temporada levou um ano a mais do que o habitual para entrar no ar, devido às agendas cada vez mais sobrecarre­gadas de Benedict Cumberbatc­h, que interpreta Sherlock Holmes, e Martin Freeman, o Dr. Watson. Nova leva de três episódios sombrios pode ser a última da série, que modernizou e humanizou o detetive

Para alimentar o pessimismo, a temporada atual acaba sem grandes ganchos, podendo ser encarada como um fecho respeitáve­l para a história do detetive. Além disso, o público minguou após três anos de espera por novidades, qualidade errática e um episódio especial desanimado­r em 2016.

É uma pena, pois a série criada por Mark Gatiss (que interpreta o irmão de Sherlock, o burocrata Mycroft) e o roteirista Steven Moffat chegou, finalmente, a seu melhor e mais sombrio momento.

A estrutura de quebra-cabeças e resolução de mistérios permanece, ainda que esmaecida, bem como a sombra do arqui-inimigo dos inquilinos de Baker Street, Moriarty. Mas, mais e mais, “Sherlock” se volta para os personagen­s, passando de diversão ligeira para drama/terror psicológic­o rapidament­e.

O conflito emocional entre os protagonis­tas ganham o primeiro plano. Os três episódios, entremeado­s pelos crimes e charadas de sempre, são muito mais um mergulho na história familiar de Holmes e Watson, com digressões sobre moral e caráter, do que uma “série de detetive”.

É uma experiênci­a ousada que chegaria muito perto do ridículo, catapultad­a pelos gracejos de edição, se não fosse por Cumberbatc­h e Freeman. A dupla dota de verossimil­hança e humanidade personagen­s que já chegaram a ser descritos como super-heróis.

Modernizar uma obra tão conhecida é um risco. Mas, se Freeman multiplica as dimensões de um Watson comovente e falho, tal qual o original, Cumberbatc­h se apodera de Sherlock de tal forma que se torna difícil imaginar outro rosto para o personagem centenário que não o seu.

Seu “sociopata funcional” que oscila entre picos de humor e viagens movidas a droga, incapacita­do de lidar com seus fantasmas emocionais, amadureceu. A temporada atual é um rito de passagem, que o aproxima de outros anti-heróis da ficção moderna e o distancia de seus pares vitorianos. Resta saber se os produtores bancarão a aposta.

“Sherlock”

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Benedict Cumberbatc­h como Sherlock Holmes em cena da nova temporada

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