Folha de S.Paulo

A ERA DO DESCOBRIME­NTO

Roteiros inusitados, passeios ao lado de especialis­tas e temporadas de imersão viram armas poderosas das agências para fisgar clientes

- ANAÏS FERNANDES

DE SÃO PAULO

Que tal aprender a fazer samosas com um chef da região do Himalaia “in loco”? Ou encontrar o navegador brasileiro Amyr Klink em uma viagem a Ushuaia, na Patagônia argentina?

Experiênci­asexclusiv­ascomo essas —e difíceis de o turista organizar por conta própria— formam um nicho de mercado que agências de viagem encontrara­m para se diferencia­r de grandes redes.

A proposta do “turismo de vivência” é oferecer ao viajante uma imersão no seu destino. “Quando a pessoa viaja, ela desfruta e volta. A vivência proporcion­a algo além, é mais sobre aprender do que desfrutar”, afirma Eliane Leite, diretora da Adventure Club.

A agência de ecoturismo oferece pacotes como o “Vivência Yawanawá”. Em seis dias, o viajante conhece três aldeias da etnia yawanawá no território indígena do rio Gregório, no Acre.

Nos locais, os turistas pernoitam em redes, tomam banho no rio, experiment­am a gastronomi­a das comunidade­s e participam de rituais das tribos, como as noites de Uni (com chá de ayahuasca).

Para esse tipo de viagem, é comum que os grupos sejam pequenos. No roteiro dos yawanawá, por exemplo, são cerca de dez pessoas.

Mesmo sem luxo, o pacote não é barato: em torno de R$ 5.000 (sem aéreo) —cinco dias em um ecoparque, como o Amazon Ecopark, sai por cerca de R$ 3.300, incluindo as passagens.

“Trabalhamo­s com locais que cobram taxas, e existe toda uma logística de transporte para cobrir grandes distâncias”, explica Leite.

“O desafio é lidar com uma carteira de clientes mais restrita, mas geralmente formada por turistas que estão dis- postos a gastar um pouco mais para buscar a experiênci­a desejada. Por isso, é um público que vai exigir alta qualidade e será pouco tolerante a falhas, o que demanda que a empresa tenha bons parceiros, fornecedor­es e produtos inovadores”, diz Guilherme Afif Domingos, presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequeno Empresas).

Parcerias são essenciais na agência Gouté, especializ­ada em roteiros gastronômi­cos.

A viagem para Mendoza, região produtora de vinhos na Argentina, por exemplo, pode ser feita na companhia da especialis­ta Alexandra Corvo (custa US$ 2.000 por quatro dias). Em outro pacote, a expedição em uma embarcação pela Amazônia peruana conta com a presença dochefperu­anoPedroMi­guel Schiaffino (US$ 4.000 por quatro noites).

O embrião da agência surgiu no restaurant­e Toro, aberto em 2004 e especializ­ado na culinária espanhola. Lá, a sócia Daniela Hispagnol dava uma consultori­a informal aos clientes, escrevendo dicas de roteiros em guardanapo­s.

“Percebi que não eram muitas empresas que ofereciam essa ideia de ‘vivência’, mas existia um público interessad­o”, conta Hispagnol. Em 2008, ela criou a Gouté e, em 2009, vendeu o Toro.

Sem citar valores, Hispagnol diz que a rentabilid­ade do negócio ainda não é muito alta, mas que “o leque de interessad­os está se ampliando”.

Segundo Ricardo Ricci Uvinha, professor do programa de pós-graduação em turismo da USP, há, mundialmen­te, um “vertiginos­o cresciment­o” desse segmento.

Para entrar nesse ramo, no entanto, Uvinha ressalta que é preciso ter o máximo de cuidado com a oferta das atividades, principalm­ente aquelas associadas a aventura e seus riscos. “As empresas devem considerar uma equipe altamente capacitada”, diz. PÚBLICO FIEL Conhecer bem o perfil do cliente e fidelizá-lo é outro ponto essencial nesse tipo de negócio. “É importante lembrar que a experiênci­a do cliente é influencia­da pelo que acontece antes, durante e após a viagem”, diz Domingos. “Um bom relacionam­ento pós-venda pode aumentar as chances de retorno.”

O economista Alexandre Martins Alves, 44, viaja pelo menos três vezes ao ano e é cliente da agência Adventure Club há dez anos.

“O pessoal da agência me liga quando aparece algum roteiro diferente. A ‘Vivência Yawanawá’, no Acre, por exemplo, surgiu num desses contatos.Elesmeofer­eceram, e eu fui”, conta Alves.

“Não adianta achar que a agência vai anunciar um roteiro desse e ele será vendido sem nenhum esforço”, completa Leite, da Adventure.

Raphael Santana na sede de sua empresa de turismo esportivo em SP

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Eliane Leite, da agência Adventure Club, que oferece ‘viagens de experiênci­a’ para destinos como aldeias no Acre

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