Folha de S.Paulo

Homologar ou não homologar?

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SÃO PAULO - A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, deve ela mesma homologar a delação premiada da Odebrecht?

Imagine, leitor, uma nação regida por um ditador caprichoso, que faz o que tem vontade sem nenhum tipo de limitação legal. Nesse país, poucos se disporiam a investir recursos e energias em algum tipo de empreitada, que poderia a qualquer momento ser desfeita pelo tirano, o qual, se estivesse de mau humor, ainda poderia mandar matar o responsáve­l. Como resultado, não veríamos muita atividade econômica, científica ou efervescên­cia cultural.

O respeito a regras preestabel­ecidas, ao conferir previsibil­idade e segurança jurídica às pessoas, funciona como um remédio contra as piores incertezas da política. Mais do que um formalismo vazio, ele é condição do próprio Estado de direito.

Então, para definir se Cármen Lúcia deve ou não homologar a delação, é preciso antes de mais nada determinar se fazê-lo está de acor- do com as leis e o regimento do STF. E, aparenteme­nte, está. Depois que Janot requereu urgência para o caso, ela pode, na condição de “plantonist­a” do Supremo, dar sinal verde para a continuida­de do processo.

É claro que apenas respeitar regras não basta. Seguir uma norma ruim produz más consequênc­ias. Por isso é preciso também que as leis tenham um propósito que possa ser descrito como virtuoso e busquem atingi-lo por meios racionais. Abre-se espaço aqui para análises de cunho mais consequenc­ialista, que vão além da simples avaliação da legalidade formal. Trocando em miúdos, vale a pena antecipar a homologaçã­o?

Penso que sim. Fazê-lo não evitará um atraso, necessário para que o futuro relator se familiariz­e com o caso, mas sinaliza que a Lava Jato, mais do que iniciativa pessoal de alguns heróis, é uma ação institucio­nal. Serviria também para retirar o sigilo legal sobre as delações, esvaziando o uso de vazamentos como arma política. helio@uol.com.br

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