Folha de S.Paulo

Desconexão senatorial

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No PMDB do Senado, lideram a lista de políticos mais influentes o presidente da Casa, Renan Calheiros (AL), e o líder do governo, Romero Jucá (RR). Como a Constituiç­ão veda a reeleição do primeiro, e como ao nome do segundo se associam vários escândalos, Eunício Oliveira (CE) consolidou-se na disputa pelo comando da Mesa Diretora, que ocorrerá na quarta (1º).

Mesmo que espécie de terceira opção em sua legenda, Eunício obteve consenso supraparti­dário. Da esquerda à direita, congressis­tas justificam o apoio com base no princípio da proporcion­alidade. Com 19 senadores, o PMDB ostenta a maior bancada.

Alguns até externam desconfort­o com a possibilid­ade de o peemedebis­ta ser abatido pela Operação Lava Jato, mas logo cedem aos apelos do pragmatism­o. É que os aliados do vencedor garantem acesso privilegia­do a postos de destaque no plenário e nas comissões.

De resto, a situação do senador cearense não é das piores. Por enquanto, Eunício foi apenas citado na delação premiada de Cláudio Melo Filho, ex-diretor da Odebrecht. De acordo com o executivo, o peemedebis­ta —codinome “Índio”— recebeu R$ 2,1 milhões para endossar medida provisória que beneficiav­a a empreiteir­a.

Os que advogam em seu favor destacam o perfil conciliado­r de um dos primeiros peemedebis­tas a aderir ao lulismo (foi ministro das Comunicaçõ­es de 2004 a 2005). Eunício, além disso, manteve discrição durante o impeachmen­t.

Em primeiro mandato no Senado, é considerad­o mais moderno que os dois últimos presidente­s da Casa, Renan Calheiros e José Sarney—oquenãoche­gaasermuit­o.

Suas caracterís­ticas decerto o habilitam a conduzir votações de interesse do governo, mas há muito os parlamenta­res deveriam ter percebido que a sociedade cobra outros fatores nessa equação.

Ainda que Eunício negue participaç­ão nos fatos relatados pelo delator e mesmo que por ora não seja alvo de investigaç­ão formal conhecida no âmbito da Lava Jato, a simples menção a seu nome em episódio desabonado­r deveria bastar para criar dissenso na eleição.

Não custa lembrar que o Congresso registra sua pior avaliação na série histórica do instituto Datafolha (58% dos entrevista­dos o consideram ruim ou péssimo) e que, em dezembro, dezenas de milhares de pessoas engrossara­m protesto que tinha o Legislativ­o como alvo.

O fato de não haver nenhum parlamenta­r capaz de rivalizar com Eunício Oliveira na disputa apenas demonstra quanto o Senado se mantém distante das ruas.

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