Medida não traz segurança, dizem analistas
Raramente um decreto anuncia um propósito mais direto e louvável do que aquele que o presidente Donald Trump assinou na sexta-feira (27): “Proteger a nação contra a entrada de terroristas estrangeiros nos Estados Unidos”.
Mas a diretriz do presidente provavelmente não reduzirá de forma significativa a ameaça terrorista nos EUA — uma parte minúscula de toda a violência desde 2001. Muitos especialistas acreditam que consequências não desejadas do decreto tornarão a ameaça ainda maior.
Desde os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, por exemplo, ninguém foi morto nos EUA em um ataque terrorista por qualquer pessoa que tenha migrado ou cujos pais tenham vindo da Síria, Iraque, Irã, Líbia, Somália, Sudão e Iêmen —os sete países visados pelo decreto que baniu vistos por 90 dias—, segundo Charles Kurzman, professor de sociologia da Universidade da Carolina do Norte.
Dos muçulmanos americanos envolvidos em extremismo de qualquer tipo, apenas 23% tinham antecedentes familiares nesses países, disse Kurzman, que acaba de publicar o último de seus estudos anuais sobre o assunto.
O principal ponto dos especialistas é que os ataques terroristas atraem um nível de atenção da mídia muito maior do que sua prevalência nos EUA, e o decreto do presidente parece se basear não num cálculo racional dos riscos, mas nos temores que os terroristas pretendem inflamar.
Há uma característica aleatória na lista de países incluídos no decreto: exclui a Arábia Saudita e o Egito, onde os fundadores da Al Qaeda e outros grupos terroristas se originaram, além do Paquistão e do Afeganistão, onde o extremismo persistente e décadas de guerra produziram militantes que ocasionalmente chegaram aos EUA. Notavelmente, talvez, a lista evitou países muçulmanos onde Trump tem grandes empreendimentos comerciais.
Pelos cálculos de Kurzman, 123 pessoas foram mortas nos EUA por terroristas muçulmanos desde os ataques de 2001 —de um total de mais de 230 mil assassinatos por membros de gangues, traficantes de drogas, cônjuges com raiva, supremacistas brancos, psicopatas etc. Assim, o decreto aborda, no máximo, 0,0005% da violência letal nos EUA. Se o pedágio do 11 de Setembro for incluído, os terroristas ainda representam apenas pouco mais de 1% dos assassinatos.
Mas terroristas não operam no reino dos fatos e das estatísticas. Seu objetivo é aterrorizar, e usam violência aleatória e espetacular para fazê-lo, com uma ajuda inestimável da cobertura que tais atentados inevitavelmente atraem.
“Na minha opinião, isso é apenas um enorme erro em termos de cooperação antiterrorista”, disse Daniel Benjamin, da Universidade Dartmouth. “Não vejo por que iríamos querer alienar os iraquianos quando eles são a força que enfrenta o Estado Islâmico em terra.”