Folha de S.Paulo

Desafios da inteligênc­ia artificial

- RONALDO LEMOS

A INTELIGÊNC­IA artificial já está entre nós. Muita gente ainda não se dá conta, mas aos poucos ela já aparece na vida cotidiana. Um exemplo são os aplicativo­s que reconhecem “linguagem natural”. Por eles conversamo­s com a máquina como falamos com outras pessoas. tarefas. Em breve, será possível E a máquina responde. mandar uma mensagem de texto

Outro componente cada vez mais ou voz para seu “assistente virtual” visível é a análise de imagens. Há reservar uma mesa em um restaurant­e, serviços de hospedagem de fotos emitir uma passagem aérea capazes de classifica­r automatica­mente ou entregar um “bom vinho” as imagens por seu conteúdo na sua casa (o próprio assistente (paisagem, grupos de pessoas, decidirá o que é “bom” para você). objetos etc.). Esse tipo de análise Em suma, estamos em um processo identifica até mesmo conteúdo pornográfi­co, acelerado de “cognificaç­ão”. sem a necessidad­e de intervençã­o Estamos adicionand­o “inteligênc­ia” humana. Por meio do chamado às aplicações de internet “aprendizad­o de máquina”, e também aos objetos físicos (como o computador “enxerga” o mundo os carros conectados e a chamada e distingue o que há nele. “internet das coisas”).

Outra aplicação recente são os Como toda nova tecnologia, a “chatbots”, aplicativo­s que conversamc­omosusuári­osedesempe­nham inteligênc­ia artificial traz desafios. Em um workshop que conduzi na Universida­de Columbia, identifica­mos alguns. O primeiro é a possível redução de empregos. Dois professore­s de Oxford (Frey e Osborne) publicaram estudo apontando que 47% dos empregos nos EUA vão desaparece­r em razão da automação nas próximas duas décadas (e não haverá muro que possa mudar essa situação).

Outro desafio é assegurar que a inteligênc­ia artificial seja utilizada em benefício da humanidade, e não contra ela. Essa preocupaçã­o levou nomes de peso, como Stephen Hawking, a assinar uma carta aberta em defesa de um uso responsáve­l e ético da inteligênc­ia artificial.

Há também pontos cegos na tecnologia. Um estudo recente mostrou que uma aplicação de reconhecim­ento facial foi incapaz de identifica­r rostos de afrodescen­dentes. A razão alegada foi que os engenheiro­s que desenvolve­ram a tecnologia utilizaram predominan­temente imagens de brancos para alimentar a base de dados da aplicação, tornando-a virtualmen­te inútil para boa parte da população global.

Outra preocupaçã­o crucial é a moralidade. Como ensinar “bom senso” ou “ponderação” para uma máquina? Por exemplo, nos carros que se autodirige­m, se um acidente é inevitável, quem a máquina deverá tentar salvar? O passageiro do carro ou dez crianças que atravessam a rua naquele momento?

São dilemas cujas variações são infinitas e precisarão ser enfrentado­s. Na minha opinião, o melhor caminho para isso é fazer avançar uma outra tecnologia, só que nesse caso milenar: o direito.

Nos carros autônomos, se um acidente é inevitável, a máquina deve tentar salvar o passageiro ou o pedestre?

RONALDO LEMOS

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