Folha de S.Paulo

Todos os pacientes nos procuram pelos resultados, pela efetividad­e e pela segurança.

- GABRIEL ALVES

DE SÃO PAULO

O médico Áureo Ludovico de Paula está no meio de um dos conflitos médico-jurídicos mais intensos dos últimos tempos. Ele é um dos principais praticante­s e defensores da técnica de cirurgia bariátrica conhecida como “gastrectom­ia vertical com interposiç­ão ileal (GVII)”. Foi ele quem operou o apresentad­or de TV Fausto Silva e o senador Romário (PSB-RJ).

Recentemen­te Romário apareceu visivelmen­te mais magro. Ele declarou ter feito a cirurgia para controlar o diabetes. A glicemia estava entre 300 e 400 mg/dl —o recomendad­o é ter menos que 100. Ele diz estar em 80 mg/dl agora.

Em entrevista à Folha ,o médico fala dos atritos com o Conselho Federal de Medicina, entidade para a qual a modalidade de bariátrica que realiza (provavelme­nte mais eficaz no tratamento de diabetes) ainda é experiment­al, só podendo ser realizada após estudos aprovados por um comitê de ética.

Na prática, no entanto, a cirurgia está liberada por uma decisão da Justiça que contraria o parecer do CFM. A decisão se deu a partir da opinião de uma junta de especialis­tas escolhida para avaliar o caso.

Para outros especialis­tas, como o médico Ricardo Cohen, coordenado­r do centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, a prática ainda é arriscada. “Precisamos de opções de cirurgia para tratar o diabetes, mas essa ainda é experiment­al, faltam estudos de médio e longo prazo.”

A mudança de status ainda pode levar alguns anos, especula Cohen. Para de Paula, no entanto, já passou da hora de ela ser totalmente reconhecid­a no país. “Desde 1985 ela é usada para o tratamento de diabetes e obesidade.” Folha - Há quanto tempo o sr. realiza essa cirurgia? Qual é a vantagem dessa técnica?

Áureo de Paula - Há mais de dez anos. Na época a cirurgia bariátrica era considerad­a de alto risco para tratamento da obesidade.

Havia limites para tratar doenças como o diabetes. Após anos de estudos, ficou evidente seria possível tratar a doença com essa cirurgia. De onde veio o interesse dos famosos pelo seu nome?

Em geral, até 85 a 90% dos pacientes são curados ou entram em remissão do diabetes e outras doenças, como o colesterol elevado, hipertensã­o arterial, obesidade e outras. Houve testes clínicos e em animais o suficiente?

A GVII já é feita em humanos desde 1928, com publicação na revista “Annals of Surgery” e foi utilizada ao longo dos anos para múltiplas indicações clínicas, gastroente­rológicas e até urológicas. Houve inúmeros trabalhos em animais. Para tratamento da obesidade e doenças associadas, ela é feita desde 1985. Por que o CFM deu parecer contrário à essa cirurgia fora do contexto de pesquisa?

A Câmara Técnica de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, composta por ilustres médicos e professore­s, aprovou a cirurgia GVII em 2010, como “não experiment­al”. Isso ocorreu após reuniões e seminários. O último teve a presença de mais de 40 especialis­tas de todo o Brasil. Está nas atas do CFM e no processo do judiciário.

A cúpula diretiva, não especialis­ta, não referendou a decisão técnica, um exemplo único na história desse tribunal ético. A cirurgia está documentad­a em dezenas de publicaçõe­s em revistas nacionais e internacio­nais com o meu nome e diversos outros autores, além de teses de doutoramen­to no Brasil, Canadá, Estados Unidos e outros. É realizada em países como Portugal, Itália, Índia, Turquia, Estados Unidos, França, Geórgia, Irã, e outros. A que o sr. atribui essa discordânc­ia entre a Justiça e o CFM?

Inicialmen­te, a discordânc­ia faz parte do esclarecim­ento das ideias e do aperfeiçoa­mento científico. A unanimidad­e é uma utopia. A Justiça Federal considerou a cirurgia como “não experiment­al.”

Essa decisão está em vigência, com efeito que atinge a todos no Brasil e que retroage no tempo. Portanto, a cirurgia nunca foi experiment­al.

A cúpula diretiva, integrada por médicos sem nenhuma vivência na área, é que discordou por motivos que somente eles podem responder. Quem é o paciente ideal para a interposiç­ão ileal?

O paciente com diabetes tipo 2, independen­te do peso.

É indispensá­vel uma minuciosa avaliação com exames de pré-operatório e subsequent­e seleção —alguns pacientes podem ser excluídos.

O paciente ideal é aquele com diabetes tipo 2, independen­te do peso. O índice de mortalidad­e é de 0,4%. Ela é tão segura quanto outras bariátrica­s

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Reprodução/Instagram Após cirurgia, Romário surgiu mais magro nas redes socais

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