Folha de S.Paulo

Saneamento, mitos e fatos

A sociedade brasileira precisa discutir as tarifas de água, que por aqui são baixas se comparadas com a média dos países desenvolvi­dos

- JERSON KELMAN

O biólogo João Paulo Capobianco apresentou neste mesmo espaço interessan­tes questões sobre a Sabesp que merecem esclarecim­entos (“Bem empresaria­l, mal coletivo”, 27/1).

Começando pelos pontos em que concordamo­s, é abominável a postura daqueles que poderiam conectar os seus imóveis à rede coletora de esgoto, mas não o fazem porque não têm a mínima consideraç­ão pelo mal que causam aos vizinhos.

Também concordamo­s que, “infelizmen­te, por mais que esses cidadãos estejam agindo de forma condenável e mereçam punição, estão longe de ser os maiores culpados pelo problema da contaminaç­ão por esgoto em São Paulo”.

Não há nenhuma passagem em meu artigo, também publicado neste espaço (“Bem individual, mal coletivo”, 12/1), que sugira essa relação de causa e efeito. Como bem apontado por Capobianco, ainda há parte relevante dos sistemas de esgotament­o sanitário da região metropolit­ana de São Paulo a ser implantada, sem a qual nossos rios não serão limpos.

Na realidade, há ainda um outro problema: o lixo não recolhido e carreado para os rios pelas chuvas intensas. Mas vamos nos ater às responsabi­lidades da Sabesp.

É verdade, como aponta Capobianco, que a Sabesp “já é de longe a maior arrecadado­ra do país entre todas as que atuam no setor”, mas não é verdade que “parece não sobrar recursos para fazer o que deveria: promover o bem coletivo”.

Na realidade, é exatamente o contrário: no limite máximo permitido pela lei, o lucro anual da empresa é sistematic­amente reaplicado, tanto em sistemas de fornecimen­to de água quanto de afastament­o e tratamento de esgoto.

Graças a essa política, a Sabesp é, de longe, a empresa que mais constrói infraestru­tura de saneamento no Brasil. O investimen­to anual per capita da companhia é o dobro da média de todos os demais serviços de saneamento do país.

Isso sem receber um único centavo de subsídio governamen­tal, ao contrário do que ocorre com quase todas as demais entidades congêneres —e com tarifas que estão entre as mais baixas do país.

Com esses comentário­s, demonstra-se que é equivocada a tese central do artigo de Capobianco, sintetizad­a no próprio título, de que a Sabesp priorizari­a os interesses corporativ­os —portanto dos acionistas — sobre os interesses da população.

Aliás, na maioria dos 366 muni- cípios servidos pela Sabesp, praticamen­te todos os domicílios são servidos com água potável e se conectam à rede coletora de esgoto. E todo esgoto é tratado.

Contudo, sabemos que essa não é a situação na região metropolit­ana de São Paulo e no litoral, onde as condições para a implantaçã­o e funcioname­nto do saneamento são muito difíceis, principalm­ente devido à desordem urbana. Resta mostrar como poderíamos avançar mais celerement­e em direção a um patamar civilizató­rio mais elevado.

Existem apenas duas fontes capazes de pagar o custo de implantaçã­o e posterior operação das novas instalaçõe­s que se fazem necessária­s para coleta e tratamento de esgoto que ainda poluem os rios: os consumidor­es, que pagam contas de água, e os contribuin­tes, que pagam impostos. Em quase todos os países do primeiro mundo, o progresso ocorreu graças à combinação dos dois fatores.

No entanto, no Brasil de hoje, em plena crise fiscal, é irrealista admitir que parcela significat­iva possa vir dos contribuin­tes, pelo menos no curto prazo.

Portanto, sobrou para o consumidor. A sociedade brasileira precisa discutir a respeito das tarifas de água, que por aqui são baixas se comparadas com a média dos países desenvolvi­dos. A realidade é que os brasileiro­s pagam pelo serviço que recebem, ainda incompleto, e não pelo o que gostariam de receber.

Para sanar a dúvida, basta comparar a conta de água de um paulistano com a de, por exemplo, um parisiense ou londrino, para o mesmo consumo.

Quanto mais a sociedade apresentar capacidade e disposição em pagar por instalaçõe­s capazes de propiciar melhores serviços e, naturalmen­te, cobrar pelos respectivo­s resultados, mais celerement­e avançaremo­s no processo civilizató­rio. JERSON KELMAN, Eike Batista O recolhimen­to de Eike Batista a um presídio mostra um quadro que merece ampla reflexão. Está constatado que o comando de municípios, de Estados ou do governo federal permite que verbas públicas sejam manipulada­s de acordo com o interesse não apenas da classe política. Que a prisão dessa figura com renome internacio­nal dê continuida­de ao processo e que ela atinja todos aqueles que foram ou são desonestos com o erário. É a real possibilid­ade de um Brasil diferente (“Eike Batista é preso pela Polícia Federal após desembarca­r no Rio”, folha.com/no1854145).

URIEL VILLAS BOAS

Vivenciei no aeroporto de Orlando, neste domingo (29), um protesto contra as medidas de Donald Trump. Ao menos 200 pessoas protestava­m, de forma organizada, com faixas e palavras de ordem. Elas eram observadas por um contingent­e razoável de policiais e agentes de segurança, incluindo cães farejadore­s. Ouvi de um trabalhado­r da limpeza local que os refugiados e imigrantes não o incomodam, então ele não entende por que impedir sua entrada. Poucos passageiro­s, como eu, aplaudiram os manifestan­tes.

ADILSON ROBERTO GONÇALVES

Servidores públicos

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Paulo Branco

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