Folha de S.Paulo

Temer quer escolher novo ministro nesta semana

- GUSTAVO URIBE VALDO CRUZ

Ives Gandra Martins Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho, é um magistrado culto, discreto, com sólida formação jurídica e reconhecid­a dedicação ao trabalho. Esse é o perfil traçado no Judiciário pelos que o veem como candidato de estilo semelhante ao de Teori Zavascki, a quem pretende suceder no Supremo Tribunal Federal.

Como membro do TST, era um dos poucos que mantinham o gabinete em dia, apesar do grande volume de processos. Como presidente, resiste a fortes pressões dentro e fora do tribunal.

Ives Filho está identifica­do com as prioridade­s do governo Michel Temer. Há anos desenvolve atividades acadêmicas com o ministro Gilmar Mendes, um dos defensores de sua nomeação.

Sua proposta de enxugar a Justiça do Trabalho e inibir o “paternalis­mo” da legislação trabalhist­a tem apoio do empresaria­do, interessad­o na redução dos encargos. Mas enfrenta forte oposição da maioria dos ministros do TST, de juízes trabalhist­as de primeiro grau e de dirigentes sindicais.

“Sua relação recente com a magistratu­ra tem sido pontuada por restrições de direitos”, diz Germano Siqueira, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrado­s do Trabalho).

O que pode dificultar sua indicação são as reações à visão ultraconse­rvadora sobre questões morais, exposta em reportagem da Folha .Emartigo de 2012, ele defendeu que a mulher seja submissa ao marido e classifico­u a relação homossexua­l como antinatura­l.

No mesmo artigo, no entanto, escreveu: “Indivíduos de orientação heterossex­ual e homossexua­l possuem a mesma dignidade perante a lei, e as pessoas homossexua­is devem, sem sombra de dúvida, ser respeitada­s nas suas opções. Além disso, das uniões homo- afetivas derivam direitos que devem ser tutelados pelo Estado, conforme antes mesmo da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal já vinha ocorrendo, mormente em questões patrimonia­is”.

Ele diz não ter “postura homofóbica, nem machista”. Alega que foram descontext­ualizados quatro parágrafos de obra jurídica de sua lavra.

Assim como o pai, o jurista Ives Gandra Martins, amigo de Temer há 40 anos, Ives Filho é vinculado à Opus Dei. O perfil conservado­r não influencio­u negativame­nte sua atuação no Conselho Nacional de Justiça (2009-2011), segundo testemunha­m três exconselhe­iros. “Ives Filho é religioso, celibatári­o, acredita em Deus, mas isso não tem nada a ver com a profissão”, diz Eliana Calmon, ex-corregedor­a nacional de Justiça.

A assessoria de Ives Filho diz que ele “defende o Estado laico e os direitos fundamenta­is de todos os cidadãos”.

“A Anamatra não gosta dele porque ele não é sindicalis­ta”, diz Eliana. “É a favor da revisão de toda essa estrutura getulista da Justiça do Trabalho. Ele não é corporativ­ista, não é amigo de ninguém, é institucio­nal”, diz a ministra aposentada do STJ.

Ives Filho foi o único conselheir­o que não assinou uma moção contra Eliana, iniciativa do então presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, diante de críticas da ministra a casos de corrupção no Judiciário.

No TST, ele tem sido rigo- lhos de Teori. O presidente driblou a armadilha da inevitável acusação de interferên­cia na Lava Jato.

Mas a presidente do STF não esperou pela definição do novo relator para tratar do nevrálgico e midiático ponto da delação da Odebrecht. O rito mais lento era esperado pelo Planalto e pelo Congresso, ambos cientes do teor explosivo das revelações.

Chamou para si a responsabi­lidade da homologaçã­o, vista como vital para a ampliação e aprofundam­ento da operação anticorrup­ção.

Assim, a procrastin­ação burocrátic­a natural da troca de relator não afetou este ponto específico do processo. Quem assumir a tarefa terá de inteirar-se dos autos, mas o fato é que uma equipe ampla de juízes auxiliares tem o “software” que processa a lógica da operação, assegurand­o ritmo de jogo que agora está nas mãos do nem sempre célere procurador-geral da República.

Cármen tirou o bode de sua sala, assumindo a eventual roso na aplicação de multas em processos protelatór­ios. Foi contra o pagamento de auxílio-moradia aos juízes.

Ives Filho preside um tribunal dividido em duas alas. Uma acredita que a proteção ao trabalhado­r deve ser maior em épocas de crise. A outra, minoritári­a e da qual faz parte, entende que a flexibiliz­ação das regras ajuda mais a proteger os empregos.

Eledizqueu­mpaísqueel­egeu um ex-sindicalis­ta presidente da República não pode considerar imaturos os sindicatos e desprezar a autonomia de patrões e trabalhado­res para negociar. A Folha publicará nos próximos dias perfis de outros cotados à vaga no STF crítica de açodamento. Como temia o Planalto, a ministra ganhou a rodada. Como no truco, ao ser “trucada”, gritou “seis!” para o desafiante.

Ao mesmo tempo, para bem e para mal ela tem demonstrad­o a proverbial prudência mineira, como no episódio em que aceitou a desobediên­cia legal do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), contempori­zando sua permanênci­a no cargo contra ordem do próprio STF. Avalizou o polêmico acordo da dívida do Rio.

E, agora, desconside­rou a ideia inicial de Teori de levantar todos os sigilos das delações automatica­mente. Assim, os personagen­s envolvidos ganham mais algum tempo para preparar suas explicaçõe­s, pelo menos até os novos e inevitávei­s vazamentos dos conteúdos.

Cármen pode não ser candidata a nada, mas coloca-se no tabuleiro político sem reservas. Como Joaquim Barbosa antes dela, resta saber se há alcance prático além do ganho de imagem nisso.

Presidente está fazendo consultas informais

Com a expectativ­a de o STF (Supremo Tribunal Federal) definir até quarta-feira (1) o novo relator da Operação Lava Jato, o presidente Michel Temer planeja escolher o novo ministro da corte até o final da semana para anunciá-lo, no máximo, na próxima.

A celeridade na escolha do ministro que irá substituir Teori Zavascki, morto num acidente aéreo no dia 19, tem como objetivo evitar a acusação de que estaria negociando um nome com trânsito político para interferir na análise dos processos e acabar com as pressões de aliados para escolher alguém ligado ao governo.

Segundo o entorno do peemedebis­ta, antes favorito para a vaga, o nome do presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Ives Gandra Filho, perdeu força. Na lista de preferidos do presidente, ainda figuram os nomes dos ministros Isabel Galotti, Luis Felipe Salomão e Rogério Schietti, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Temer tem confidenci­ado a assessores que seu escolhido não poderá representa­r uma afronta ao STF nem ser alvo de críticas generaliza­das da opinião pública. Nas palavras de um auxiliar, ele não quer abrir zonas de atritos com esses dois grupos.

Foi por isto que, nesta segunda-feira (30), o presidente fez questão de dizer que Cármen Lúcia tomou a decisão certa ao homologar as delações da Odebrecht, apesar de seus aliados preferirem que isto ficasse a cargo do novo relator da Lava Jato.

Em conversas reservadas, Temer tem dito acreditar que o ministro Luiz Edson Fachin passe a fazer parte da 2ª Turma da corte, onde deverão ser redistribu­ídos os processos da Operação Lava Jato.

Caso isso não ocorra, contudo, o nome que ele indicar substituir­á o ministro Teori Zavascki entre os cinco ministros que analisam os processos da Lava Jato, o que justificar­ia uma indicação rápida do presidente.

Nas palavras de um assessor presidenci­al, Temer tem a consciênci­a de que não pode ser acusado de atrasar a Lava Jato. Em um esforço para que não seja acusado de querer interferir no Poder Judiciário, o presidente deve fazer consultas informais, por meio de amigos e até pessoalmen­te, a Cármen Lúcia e também ministros como Gilmar Mendes e Celso de Mello antes de definir um nome.

Temer tem se queixado da pressão de partidos como PMDB e PSDB na tentativa de emplacar nomes para o STF.

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Ruy Baron - 15.abr.2016/Valor O presidente do Tribunal Superior do Trabalho e cotado ao STF, Ives Gandra Martins Filho

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