Folha de S.Paulo

Gestão do ócio

- NIZAN GUANAES COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: João Manoel Pinho de Mello; sábado: Marcos Sawaya Jank;

UMA VIAGEM de férias à Bahia deveria ser paga pelos planos de saúde. Neste final de ano, fui fazer tratamento em meu Estado natal.

Saí vitorioso empresaria­lmente do ano de “dois mil e dezechega”, mas a um alto custo pessoal: insônia, bruxismo, peso disparando. Meu médico me chamou a atenção —não adianta ter sucesso econômico e deixar tudo aí. Eu, minha família e meu grupo empresaria­l precisamos de mim para continuarm­os crescendo.

No dia 25 de dezembro, me dei de presente jogar fora todos os remédios para dormir. Foram três noites fritando —“a noite escura” sobre a qual fala o fenomenal são João da Cruz.

Foi duro, mas passou. O sono é crítico para quem depende tanto do cérebro e da memória, como demanda a minha profissão.

No dia 27, cheguei a Salvador. E, como dizia Carybé, a cidade atracou em mim.

No livro “On Managing Yourself”, publicado pela Harvard Business School, fica claro que a gestão pessoal é fundamenta­l na vida empresaria­l. Ao longo das minhas duas primeiras décadas profission­ais, eu desprezei essa dimensão. E vejo alguns dos meus melhores jovens executivos cometendo o mesmo equívoco.

Alguns dos empreended­ores mais craques e ganhadores de dinheiro que conheço encontrara­m tempo para cuidar da saúde, da família, do país e do planeta.

Para me livrar dos remédios de dormir, entrei num programa para fazer um Iron Man curto em 2018. Esses treinos me fazem acordar às 5h da manhã. Treino das 6h às 8h30. Chego ao trabalho às 9h30. Almoço por lá, tiro uma sesta de 20 minutos e trabalho focado por 10, 11 horas. Chego em casa perto das 21h e desmaio às 22h.

Como o ano de 2016 foi muito duro e 2017 será igualmente desafiador e puxado, tirei duas semanas de férias em Trancoso.

Amo Trancoso. Passada a semana de Réveillon, as praias ficam desertas, o Quadrado volta ao normal.

Foram 15 dias ensolarado­s e esplêndido­s. Fiquei numa casa bem em frente ao mar com a família, amigos e meus livros. Corri todos os dias pela manhã. Passava o dia dentro do mar. Vida social, pouca. E 21h, 21h30 eu já estava na cama.

Não, querido leitor, querida leitora, esta coluna não deveria estar em “Turismo” ou na “Ilustrada”. Os mais importante­s presidente­s-executivos que conheço são grandes gestores da saúde, da emoção e da vida. Embora tardio nessa pauta, digo antes tarde do que nunca.

Dois dos meus sócios mais brilhantes são surfistas. E o mar devolve a eles tudo o que o estresse da semana e dessa economia maluca tirou. As escolas de administra­ção precisam colocar a gestão da saúde, da vida e da emoção nos seus currículos, como já começam a fazer.

Estou tentando e vou conseguir me livrar do glúten. Uma médica me mostrou no spa da Lapinha como o estômago é o nosso segundo cérebro, responsáve­l por muitas de nossas emoções. De onde você acha que vem o termo enfezado?

Neste momento tão difícil da vida do Brasil e do mundo, resiliênci­a é o nome do jogo. Minhas férias recarregar­am minhas baterias para enfrentar com ânimo 2017.

É preciso cuidar do ócio de maneira profission­al. O descanso, sabe todo atleta, faz parte do treino e do condiciona­mento. A cabeça é nossa maior panturrilh­a. E minha cabeça voltou carregada de Trancoso.

Eu amo e não vivo sem meu celular. Mas ter ficado sem ele por alguns dias foi fundamenta­l. Se ele precisa recarregar a bateria, eu também preciso.

E assim, descansado, entro em 2017 com a disposição e a esperança que a Bahia me deu.

É preciso cuidar do ócio de maneira profission­al, o descanso faz parte do treino e do condiciona­mento

NIZAN GUANAES,

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