Comédia acessível trata da história da mítica Pombagira
FOLHA
Nascido ao ar livre há milênios, o teatro persevera em disputar o espaço público. Na São Paulo de hoje, coletivos riscam o chão nos territórios de maior fluxo de pessoas.
Caso dos frequentadores de todas as idades e trabalhadoras do sexo que dividem os fins de semana no parque Jardim da Luz com uma comédia sobre Pombagira, entidade da umbanda e do candomblé, da Fraternal Companhia de Arte e Malas-Artes.
O ambiente impacta a recepção ao espetáculo “A Gira da Rainha”. A sociabilidade diante das prostitutas inscritas no cotidiano do parque pelo menos desde a década de 1930, quando autoridades mandaram fechar os bordéis do centro a fim de isolá-las, tem a ver com o preconceito enfrentado pela protagonista que assumiu o direito ao prazer e à sensualidade.
A dramaturgia épica remonta a meados do século 14, na Espanha da Idade Média, quando Maria Padilha é amante de dom Pedro, o Cruel, rei de Castela.
No vaivém dos fatos, ele é pressionado pela mãe a casar-se com uma francesa de dotes, mas não deixa de viver o amor paralelo até a morte dela, vítima da peste e acusada pela família real de enfeitiçá-lo. Pois ele ainda ousa coroá-la rainha póstuma.
Nessa primeira parte, os dramaturgos Luiz Oliveira Santos e Alex Moletta quase levam a comédia a pique pelo tom enciclopédico.
Duas boias o salvam. O mamulengo no prólogo, quando o casal de bonecos destila a perseguição às religiões afrobrasileiras e o narrador os contrapõe. E o deslocamento definitivo da história oficial para a reinvenção popular com Padilha entrecruzada às mestiçagens, prestigiada em Angola e acolhida de braços abertos no Recife, e dali a outras regiões do país.
O diretor Ednaldo Freire cumpre aquilo que é dito no início: entretenimento e reflexão. Dosa a lascívia para as crianças presentes. Prefere o caráter festivo, a evolução alegórica (oportunas a saudação ao teatro de revista e a surpresa do desfecho).
Esquiva-se, no entanto, da ritualidade presumida, sob alegação de não replicar em cena o ponto de terreiro. Questionável, pois o cântico e as simbologias emanam lá sua magia cênica e, aqui, ficam limitados a inserções rítmicas nas composições de Lincoln Antonio.
No geral, os atores têm atuações corretas. Já o palco itinerante sustentado por caminhão fica acima da cabeça da plateia, o que dificulta o campo de visão no plano baixo. QUANDO sáb. e dom., às 15h; até 12/3 ONDE Parque Jardim da Luz, r. Ribeiro de Lima, 214, Bom Retiro, tel. (11) 3227-3545 QUANTO grátis; livre AVALIAÇÃO bom QUANDO sex. a dom., às 15h; até 19/2 ONDE Caixa Cultural São Paulo, pça. da Sé, 111, tel. (11) 3321-4400 QUANTO grátis CLASSIFICAÇÃO 6 anos