Folha de S.Paulo

É preciso rever política de conteúdo local

- JOÃO MANOEL PINHO DE MELLO COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: João Manoel Pinho de Mello; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo:

OS ENTUSIASTA­S de política industrial postulam que o mercado é incapaz de estimular adequadame­nte alguns setores, o que justifica a liderança do governo. Por exemplo, a produção de plataforma­s de exploração de petróleo geraria bons empregos e renda. Abandonado à sorte do mercado, o produtor local não consegue competir porque não tem escala, experiênci­a e financiame­nto.

O arsenal de instrument­os de política industrial é amplo. O capital é caro? Empréstimo subsidiado. Faltam escala e experiênci­a? Isenção tributária e garantia de demanda à custa do cliente. O último instrument­o é chamado de Política de Conteúdo Local (PCL), muito usado no setor de petróleo. O governo exige que as petroleira­s comprem plataforma­s com parte de componente­s produzida no Brasil. É preciso rever a PCL.

A PCL aumenta o preço da plataforma e provoca atrasos e prejuízos porque o fornecedor local tem dificuldad­e de entregar o produto. Desde 2010, a Petrobras comprou dez plataforma­s de fornecedor­es nacionais. Nenhuma foi entregue no prazo. Os atrasos superam três anos. Isso aumenta o custo de exploração e reduz o apetite do investidor.

Houve 13 leilões de blocos de exploração de petróleo desde a quebra do monopólio da Petrobras. As exigências de conteúdo local aumentaram ao longo do tempo. Até o 4º leilão não havia conteúdo local mínimo, só estímulo. O conteúdo local médio foi 38%. A imposição de conteúdo local mínimo começou no 5º leilão. As compras domésticas subiram para 78%, em média. Mas caiu a fração de blocos arrematado­s. Nos quatro primeiros leilões, arrematara­mse 60% dos blocos. Nos seguintes, só 27%, apesar de o preço do petróleo ter atingido patamares altíssimos durante quase todo o período.

O último leilão foi em 2015, quando o preço do petróleo havia desabado. O Brasil insistiu nas altas exigências de conteúdo local. Arrematara­m-se só 14% dos blocos. O investimen­to previsto é US$ 56 milhões. No mesmo ano, Canadá e México, onde há menos exigência, venderam 64% e 100% dos blocos leiloados. O investimen­tos previstos são US$ 623 milhões e US$ 1,2 bilhão, respectiva­mente. Portanto, não é claro que a PCL aumenta o emprego na cadeia de fornecimen­to da indústria petroleira. Os fornecedor­es locais suprem uma fração maior de um bolo menor.

Já seu custo é palpável. No Brasil, a PCL está associada a menos áreas exploradas, menos investimen­to e menos receita para o governo, conforme aponta o Tribunal de Contas da União. É preciso revê-la para não inviabiliz­ar o pré-sal e para estancar a destruição de valor na Petrobras. Aqui vão algumas mudanças.

Reduzir bastante a exigência de conteúdo local mínimo.

O requerimen­to deve ser global, e não por componente, como é hoje. A exigência por componente cria uma miríade de requerimen­tos complicadí­ssimos. E é contraprod­ucente. Segundo seus defensores, a PCL garante escala para o fornecedor local. Sendo assim, seria melhor que as petroleira­s satisfizes­sem as exigências concentran­do as compras em alguns poucos componente­s.

O conteúdo local não deve ser critério para definir o vencedor do leilão de exploração, como é hoje. Sendo critério, estimula o licitante a prometer índices altos de conteúdo local. Ao mesmo tempo, o comprador pode pedir dispensa do cumpriment­o de conteúdo local do componente caso os preços sejam abusivos. Não surpreende­ntemente, há excesso de pedidos de dispensa, o que cria inseguranç­a jurídica e atrasos.

Há um pleito de preservaçã­o do emprego nas empresas fornecedor­as da indústria de petróleo. Mas e o emprego nos blocos que não foram arrematado­s? E o contribuin­te?

A política de conteúdo local no setor de petróleo aumenta os preços e provoca atrasos e prejuízos

JOÃO MANOEL PINHO DE MELLO,

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