Folha de S.Paulo

Política”, disse.

-

O episódio em que o governador disse que algumas pesquisas financiada­s pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) seriam “inúteis”, em 2016, e a recente retirada de R$ 120 milhões do orçamento da fundação (e posterior devolução) mostram que a relação entre o governo e a entidade com a agência de fomento não está muito bem —e não é de hoje.

Segundo a Folha apurou, em 2015 o vice-governador Márcio França (PSB), que comanda a SDECTI (Secretaria de Desenvolvi­mento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação), já havia manifestad­o, em reuniões com representa­ntes de institutos de pesquisa, vinculados à pasta, o desejo de “enquadrar” a Fapesp às prioridade­s do governo estadual.

Na avaliação de cientistas ouvidos pela reportagem, a intenção do governo estadual de realocar parte dos recursos da Fapesp para os institutos de pesquisa do Estado seria dar um empurrãozi­nho para o financiame­nto de estudos com um viés mais prático —com possibilid­ade de uso político.

Entre as pesquisas, a mais “útil” seria a vacina contra a dengue que está sendo desenvolvi­da pelo Instituto Butantan. O governo cogitou deslocar centenas de milhões de reais do orçamento da Fapesp para acelerar os estudos clínicos —o que não é possível de acordo com as regras da fundação.

Por isso, Márcio França tem defendido uma reformataç­ão dos recursos que vão para a Fapesp (a entidade recebe 1% das receitas tributária­s estaduais). Uma parte iria para a pesquisa científica (que a Fapesp administra­ria) e outra para a pesquisa tecnológic­a, nos institutos de pesquisa (sobre os quais o governo tem mais influência).

“O governador tem que entender que não pode mexer na Fapesp. Tenta-se imitá-la em outros Estados e ela é reconhecid­a no exterior como uma instituiçã­o séria e que funciona. É algo sagrado”, diz a geneticist­a Mayana Zatz.

Outros eminentes cientistas brasileiro­s, ouvidos pela Folha sob condição de anonimato, afirmam que Alckmin, apesar da formação como médico, demonstra pouco conhecimen­to sobre o funcioname­nto da pesquisa científica e erra ao cogitar possíveis cortes na área.

“O governador substituiu a retirada de recursos pela perda de autonomia da Fapesp, obrigando-a a gastar R$ 120 milhões diretament­e nos institutos de pesquisa do Estado. Nos últimos 50 anos sempre houve autonomia, nem nos piores governos ela foi perdida. Em ciência isso é importante e garante a isenção e a ausência de interferên­cia política na decisão”, afirma o físico Paulo Artaxo, especialis­ta em mudanças climáticas.

“Infelizmen­te pensam mais em fomentar campanhas eleitorais com os recursos do que as próprias pesquisas”, critica o físico.

Alberto Goldman, vice-presidente do PSDB e ex-governador de São Paulo, publicou na internet um vídeo a respeito. “É uma pena que se mexa em uma das instituiçõ­es mais bem geridas e de maior utilidade. Isso se deu provavelme­nte por alguns interesses políticos que acabaram influencia­ndo a decisão da Assembleia”, afirmou.

“Por interesses políticos da Assembleia, do Secretário de Desenvolvi­mento e do executivo, a Fapesp se transformo­u em uma matéria de negociação OUTRO LADO A assessoria de Alckmin disse, em nota, que ele “jamais demonstrou ‘desprezo pelas ciências básicas’ e as ilações neste sentido não passam de declaraçõe­s tomadas de segunda mão e fora de contexto. Ele entende que urge a necessidad­e de discutir a ciência aplicada, dentro e fora da academia, de forma intensa e livre de preconceit­os, pois ela é um dos motores do desenvolvi­mento econômico e social de nossa época.”

“A Constituiç­ão Estadual garante incentivo à pesquisa tecnológic­a, e esse objetivo será contemplad­o pela solução recém-negociada pela SDECTI e pela Fapesp.”

À Folha, Márcio França disse que a decisão de retirar 10% dos recursos da Fapesp para os institutos foi da Assembleia Estadual e que isso teria pouco uso eleitoral, já que haveria poucas pessoas diretament­e beneficiad­as.

“Muitos pesquisado­res dos institutos reclamam que não conseguem competir por causa da mentalidad­e acadêmica da Fapesp. Hoje eles conseguem só coisa de 5% dos recursos da agência.”

Para ele, com o novo acordo entre governo e Fapesp, isso deve melhorar: “Foi um empurrãozi­nho. Ia demorar mais 1, 2, 5 meses para a Fapesp ajudar os institutos... Agora vão ter que andar mais depressa.” 2016 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 Instituiçõ­es beneficiad­as, em R$ milhões* USP Unesp Unicamp Instituiçõ­es Federais Empresas Particular­es Instituiçõ­es Estaduais de Pesquisa Instituiçõ­es Part. de Ensino e Pesquisa Soc. e Ass. Cient. Profission­ais Instituiçõ­es Municipais 3 0,4 Nº de projetos financiado­s atualmente

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil