Folha de S.Paulo

Cobradores em xeque

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Arrasta-se há mais de dois anos um impasse jurídico que trava os planos para a extinção gradual da função de cobrador nos ônibus de São Paulo, decisiva para a redução dos custos do sistema de transporte coletivo municipal.

Na gestão de Fernando Haddad (PT), ao final de 2014 a prefeitura trabalhou na Câmara Municipal pela derrubada da legislação que torna obrigatóri­a a presença de um segundo funcionári­o, além do motorista, em todos os veículos.

Devido ao expediente heterodoxo empregado na ocasião —a inclusão do tema em um projeto já em tramitação, que originalme­nte tratava apenas de tributos—, a decisão dos vereadores favorável à mudança da regra acabou por tornar-se alvo de uma batalha judicial ainda sem desfecho.

Agora, conforme noticiou esta Folha, o prefeito João Doria (PSDB) cogita a possibilid­ade de instituir tarifas mais elevadas para os passageiro­s que optem pelo pagamento da viagem em dinheiro.

Se levada a cabo, a ideia do tucano complement­aria a ofensiva iniciada pelo petista. Os objetivos, nos dois casos, estão corretos, ainda que se possa debater a melhor estratégia de execução.

Atualmente, apenas 6% dos usuários dos ônibus da capital pagam suas passagem com cédulas e mo- edas; os demais se valem de bilhetes eletrônico­s, em especial os aceitos também no metrô e nos trens, ou têm direito à gratuidade.

Com tão pouca gente a atender, os cobradores convertem-se num caro anacronism­o. Os cerca de 20 mil profission­ais custam ao sistema R$ 900 milhões ao ano, o equivalent­e a 10% do dispêndio total. A conta é repassada aos passageiro­s e, em parte, aos contribuin­tes.

A eliminação do desperdíci­o permitiria ao município, com efeito, reduzir o gasto com subsídios ao transporte coletivo, estimado em cerca de R$ 3,2 bilhões neste ano —e agravado porque Doria decidiu buscar popularida­de fácil e imediata com o congelamen­to da tarifa.

Cidades como Campinas e Ribeirão Preto já vetaram os pagamentos em dinheiro; em Campo Grande (MS), a função de cobrador foi suprimida para pôr fim a assaltos; a passos lentos, o Brasil começa a seguir a tendência mundial.

Ressalve-se que, a despeito do atraso, não se pode prescindir do cuidado em preservar empregos.

Os atuais cobradores devem ser realocados em outras funções; o ajuste do quadro de pessoal ocorreria de forma paulatina, com a não substituiç­ão de trabalhado­res que deixem seus postos. Assim, a oposição sindical ao processo perderia o que ainda lhe resta de sentido.

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