Folha de S.Paulo

Governo Trump pede à Justiça veto a estrangeir­os ‘sem laços’ com os EUA

Casa Branca defende retomada de parte de decreto anti-imigração a juízes de corte de apelação

- ISABEL FLECK

Magistrado­s ouvem argumentos dos dois lados após juiz barrar ordem executiva de forma temporária

Numa audiência de mais de uma hora transmitid­a ao vivo na TV americana nesta terça (7), o advogado que representa o governo Trump na disputa sobre o veto a cidadãos de sete países de maioria muçulmana defendeu aos juízes da 9ª Corte de Apelações que ao menos os indivíduos que “não têm laços” com os EUA voltem a ser barrados.

O pedido é uma tentativa de retomar pelo menos uma parte da proibição prevista no decreto assinado por Trump no fim de janeiro.

A ordem presidenci­al, que determina o bloqueio à entrada de cidadãos de Síria, Líbia, Irã, Iraque, Iêmen, Somália e Sudão por 90 dias, e de refugiados por 120 dias, com base em uma possível ameaça à segurança nacional, está suspensa por uma liminar.

“Mesmo que os juízes considerem algumas formas de aplicação do decreto problemáti­cas, a liminar é excessivam­ente ampla”, disse o advogado do Departamen­to de Justiça August Flentje aos juízes da corte de apelação, em San Francisco, na audiência por telefone.

Os três magistrado­s responsáve­is —William Canby Jr., Richard Clifton e Michelle Friedland, nomeados por Jimmy Carter, George W. Bush e Barack Obama, respectiva­mente— ouviram ainda os argumentos de Noah Purcell, advogado do Estado de Washington, representa­ndo a parte que questiona o decreto na ação que motivou a liminar da última sexta-feira.

A decisão da Corte sobre a retomada ou não do decreto deve ser anunciada ainda nesta semana. A expectativ­a é que qualquer dos lados que perder a disputa na corte de apelação recorra à Suprema Corte.

Horas antes da audiência, Trump sugeriu que levaria o caso à mais alta corte do país, se fosse derrotado: “Vamos ver. Tomara que não seja necessário”.

Flentje, com quem os juízes foram bem mais incisivos em seus questionam­entos, disse que o o Estado de Washington considera, em sua argumentaç­ão, o impacto do decreto sobre quem tem visto e já tinha alguma ligação ou havia entrado anteriorme­nte no país.

Com base nisso, pediu que os demais cidadãos dos sete países voltassem a ser vetados.

O advogado do governo ainda defendeu a autoridade do presidente em determinar que há um “risco real” em permitir a entrada de cidadãos dos sete países, e foi confrontad­o se a decisão do Trump era, portanto, inquestion­ável. Após uma pausa, ele concordou.

Para o representa­nte do Estado de Washington, o gover- ARGUMENTO DE DEFESA DO GOVERNO no estaria tentando fazer com que os juízes “abdicassem” do seu papel de monitorar o Executivo e trouxessem “o caos de novo ao país”.

Purcell, contudo, também foi questionad­o pelo juiz Clifton sobre o argumento de que o decreto mira muçulmanos, já que a proibição do governo atinge apenas uma pequena parte do total de islâmicos que estão no país ou que viajam para ele —e que não há menção à religião na ordem.

O advogado evocou então as declaraçõe­s de Trump, que durante a campanha à Casa Branca, prometeu barrar muçulmanos. MEA CULPA Antes da audiência, o secretário de Segurança Doméstica, John Kelly, reconheceu que o governo deveria ter esperado mais para soltar o decreto.

“Olhando em retrospect­o, eu deveria —e isso é minha culpa— ter atrasado [o decreto] só um pouco, para poder conversar com os membros do Congresso, particular­mente com a liderança de comitês como esse, para prepará-los para o que estava por vir”, disse Kelly à Comissão de Seguran- ça Doméstica da Câmara.

O decreto sofreu forte resistênci­a popular, da oposição e até entre republican­os no Congresso. O presidente da Comissão, o republican­o Michael McCaul, classifico­u a decisão presidenci­al como “problemáti­ca”.

Desde a suspensão do decreto, no fim de semana, cidadãos dos países atingidos pela medida aproveitar­am a “janela” para embarcar para os EUA antes que a proibição voltasse a valer. A liminar fez com os 60 mil vistos revogados desde a assinatura do decreto fossem revalidado­s.

Trump sustenta que esses países apresentam ameaça terrorista —o Irã, por exemplo, é classifica­do por ele como o “Estado terrorista número 1”— e, no domingo, disse que o juiz James Robart, responsáve­l pela liminar, e o sistema judiciário deveriam ser culpados se “algo acontecer” nos EUA.

Na segunda, ex-altos funcionári­os de inteligênc­ia e grandes empresas de tecnologia entregaram à corte documentos contra o decreto.

Mesmo que considerem algumas formas de aplicação do decreto problemáti­cas, a liminar é muito ampla

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