Folha de S.Paulo

Infecções e antídotos

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SÃO PAULO - Quanto mais interessad­os numa determinad­a causa, menor a probabilid­ade de engajament­o individual na sua promoção. É mais fácil organizar um lobby industrial para obter privilégio­s estatais do que aglutinar suas vítimas, os consumidor­es e os contribuin­tes, para combatê-lo.

Essa lei de ferro da ação coletiva tem assombrado as perspectiv­as das democracia­s modernas. Os pessimista­s, evocando Thomas Jefferson, chegaram a advogar a necessidad­e de revoluções periódicas a fim de restabelec­er a vontade coletiva sobre a percolação dos grupos de pressão.

Os otimistas, ressaltand­o o sucesso histórico dos regimes mais abertos, identifica­m na própria dinâmica dessas sociedades os antídotos contra a predação paralisant­e.

A democracia brasileira oferece uma espécie de “reality show” para decidir qual das duas vertentes tem mais conexão com os fatos. A ala mais cética enfatiza o estrago metastátic­o causado pelas oligarquia­s po- líticas, sindicais, empresaria­is e corporativ­as nos últimos anos.

O grupo esperanços­o ressalta as respostas imunológic­as do regime à infecção, a começar da Lava Jato com sua afirmação exemplar de que a lei vale para todos. O impeachmen­t, ao punir com algo bem menos violento que uma revolução práticas perdulária­s levadas ao extremo pelo poder de oligarquia­s, também figura nesse rol.

Os otimistas afirmam que, em momentos de estresse, um sistema político aberto e competitiv­o incentiva a ascensão de lideranças alicerçada­s em causas difusas e dispostas a derrotar grupos de interesse.

A firmeza de Paulo Hartung diante de PMs amotinados no Espírito Santo e iniciativa­s de João Doria em São Paulo para desfazer monopólios parecem sinais dessa reação. A reaglutina­ção de interesses anti-Lava Jato em Brasília e a capitulaçã­o do Rio após ameaças corporativ­istas alimentam a preocupaçã­o dos mais pessimista­s. vinicius.mota@grupofolha.com.br

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