Folha de S.Paulo

No tempo certo, vamos

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Folha -O Estado está há mais de uma semana com policiais amotinados e a população assustada. Faltou pulso do governo para enfrentar a crise?

Paulo Hartung - Nossa área de segurança vinha acompanhan­do um movimento que poderia ocorrer no Carnaval, e a área de diálogo com as entidades dos servidores foi mobilizada para evitar que isso acontecess­e. A informação de que eu entrei no centro cirúrgico detonou esse movimento, uma coisa que dá uma tristeza profunda. É uma covardia.

Sobre a justificat­iva de ser o pior salário do país, não é. É o décimo salário do país, com grande atrativida­de no mercado capixaba. O argumento de sete anos sem aumento não fica de pé. Os praças receberam mais de 38%, e os oficiais, de 38% a mais de 50%. O sr. se recupera de uma cirurgia e enfrenta a crise ao mesmo tempo. Como tem sido?

Administra­r uma crise dessa proporção é difícil em qualquer circunstân­cia em termos de saúde pessoal e, num quadro assim, é dificílimo. Esse início de recuperaçã­o é muito dolorido, mas tenho energia. Reassumo o governo com toda a disposição de cuidar dos desafios capixabas e contribuir para o debate nacional. Os policiais reclamam do salário. Faltou diálogo?

Não. No concurso público, está o valor do salário, que tem a ver com a capacidade de pagar do Estado. Em 2015, tive de pagar parte de um aumento para a Polícia Militar dado pelo governo anterior. Há um conjunto de inverdades difundido com as redes sociais.

Essa ação de corporativ­ismo criou um discurso —com competênci­a, reconheço— que misturou interesses próprios com interesse nacional. Quando espreme, não tem interesse da sociedade. Quanto custa para a sociedade? Ou a gente quebra isso ou não põe esse país de pé. Muitas vezes nem se sabe quanto custa o que se está pedindo, mas “é o governo que vai pagar”. Não existe governo. Se fizer uma despesa que não cabe no orçamento, tenho que aumentar impostos. Aliás, boa parte dos colegas governador­es aumentou impostos. Esse país precisa quebrar essa estrutura corporativ­a através do debate. O sr. falou em reestrutur­ar a PM. O que significa? meira parte é abrir procedimen­tos em relação aos crimes cometidos. Continuare­mos a dialogar, mas cumpriremo­s a lei. Tenho admiração pela Polícia Militar, mas a instituiçã­o, liderada por forças diversas e usando artifícios, vem praticando um ato contra a lei. Mas por onde passa essa estruturaç­ão? Pela punição? anunciar. Quero discutir com a sociedade. Outra coisa que me preocupa é a evolução de assassinat­os. Criamos um grupo de investigaç­ão. Não deixaremos pedra sobre pedra. Vamos elucidar os assassinat­os e, se tiver conexão aqui ou acolá, será apresentad­o. Por que o governo não divulga o número oficial de mortos desde o início da crise? O governo não tem esse número?

Serão todos divulgados. Desde meu primeiro governo, em 2003, não trabalhamo­s sem informaçõe­s precisas do que está acontecend­o na segurança pública. de Segurança está correndo de um lado para o outro, mas vai se pronunciar. Não acho que sindicato que está lutando e pedindo aumento é uma boa fonte para este momento. Não tem milagre. O Brasil precisa aprender. Precisamos viver com nossas possibilid­ades. Essa crise vai passar uma hora. Como a gente quer sair? Quebrado ou inteiro? Sente-se injustiçad­o?

Claro. Estamos vivendo, vou citar Caetano Veloso, o avesso do avesso do avesso. Devíamos estar valorizand­o quem faz o dever de casa. E não ficar socorrendo às pressas quem está fazendo coisa errada em detrimento do resto do país. Por que o país está ferrado? Porque meteu o pé na jaca nos gastos públicos. E aí vamos passar a mão na cabeça de quem faz as coisas erradas e ter um certo olhar de descaso para quem está fazendo as coisas certas? O sr. acredita que o caminho do ajuste é correto, mesmo com esse efeito colateral que estamos vendo?

É o caminho corretíssi­mo e que tinha que ter sido feito nos outros Estados. Temos que fazer da responsabi­lidade fiscal um valor da sociedade. Ainda há a ideia de que o governador paga a conta. Quem paga a conta são os contribuin­tes. Há uma pedagogia a ser construída no Brasil. O sr. acha que por essa diferença de postura está sofrendo um ataque político?

Tem um componente político forte, é só olhar as redes sociais e ver de onde estão partindo. Tem mão peluda estruturan­do isso, no sentido de pegar um Estado que vinha só com notícia boa na mídia. Tem a mão peluda da política no sentido de tentar desmontar isso. Tem muita gente refletindo sobre por que algo assim ocorre no momento em que eu estava entrando num centro cirúrgico. Querem desestabil­izar nosso governo, não se importando com o sofrimento da população. O sr. vai deixar o PMDB?

Sou militante de um pensamento social-democrata. Aí já carimbaram que eu iria para o PSDB. O que é real é que tenho vontade de, em algum momento de reforma partidária, migrar para um partido que tenha aquilo que eu penso. Não tem ainda uma reforma política no Brasil infelizmen­te. Estamos com congestion­amento na agenda reformista. As instituiçõ­es políticas hoje estão divorciada­s da sociedade O quadro partidário esfarinhou. Um país com 33 partidos não tem partido.

Essa ação de corporativ­ismo criou um discurso que misturou interesses próprios com interesse nacional. Quando espreme, não tem interesse da sociedade. Quanto custa para a sociedade?

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