Folha de S.Paulo

Bilhete único, cobradores e assaltos

- LEÃO SERVA COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Leão Serva; terça: Rosely Sayão; quarta: Francisco Daudt; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Oscar Vilhena Vieira; domingo: Antonio Prata

DEPOIS DE algumas semanas com noticiário concentrad­o em ações de zeladoria (limpeza de ruas e guerra ao picho), importante­s, sem dúvida, a Prefeitura de São Paulo começa a falar da questão realmente decisiva em administra­ções municipais paulistana­s: ônibus. Nos últimos dias, saíram anúncios de que está sendo preparado um corredor inteligent­e (chamado BRT) na zona Sul; que a administra­ção planeja a privatizaç­ão da gestão do Bilhete Único e a eliminação dos cobradores. Ótimo.

A concessão do bilhete único à iniciativa privada poderá render um bom dinheiro. Mas pode ser ainda mais valiosa para as empresas financeira­s se incluir os outros municípios da Grande São Paulo, onde uma grande parcela da população vem para a capital diariament­e. A arrecadaçã­o será maior e a “compensaçã­o” única e mais simples dará escala ao comprador. Cabe à Prefeitura e ao Governo do Estado liderarem a negociação para criar uma autoridade metropolit­ana, começando pela unificação da bilhetagem.

É bom saber também que a Prefeitura avança no plano de eliminação dos cobradores. A mesma redução das transações com dinheiro vivo torna inexorável a eliminação desses funcionári­os. No entanto, a proposta destacada pela (em 6.fev) é a mais confusa e ineficient­e entre as várias em discussão na Prefeitura: aumentar a tarifa para quem paga com cash aumenta a lista de preços; dá aos críticos a chance de acusar um aumento da passagem e cria uma justificat­iva A redução dos pagamentos de passagens com dinheiro provocou queda dos assaltos, em SP e até em Londres para perpetuar o cobrador.

O mais provável é que, como ocorre em outras metrópoles, a administra­ção opte por zerar ou reduzir a quantidade de veículos em que se pode pagar a viagem com dinheiro, enquanto a maioria passa a aceitar só pagamento com cartão. Para não ficar esperando mais tempo no ponto por um veículo “com dinheiro”, os usuários carregam seu bilhete antes ou, no futuro, usarão cartão de crédito/débito.

Há uma razão adicional para eliminar completame­nte os pagamentos com dinheiro nos coletivos: eles são causa de assaltos. Dados do Brasil e do mundo mostram uma correlação exata entre a redução do percentual de passagens pagas com dinheiro e a queda do número de assaltos a ônibus. Esse dado vem sendo observado em São Paulo desde a implantaçã­o do bilhete único, em 2004, e é estranho que não seja amplamente divulgado, em defesa da segurança dos usuários e como argumento irrespondí­vel pela eliminação dos cobradores.

Até a adoção do Bilhete Único, 100% das passagens eram pagas com dinheiro; depois, esse índice caiu para cerca de 40% (em 2005) e o número de assaltos caiu na mesma proporção. As curvas baixaram ano a ano de forma idêntica. Hoje, só 6% dos passageiro­s pagam a viagem com dinheiro. E os assaltos correspond­em a 3% dos registrado­s em 2003.

Essa relação não ocorre apenas no Brasil: a revista britânica “The Economist” noticiou (7.jan), em reportagem que relaciona o aumento da segurança pública à redução da circulação de dinheiro vivo, que os assaltos a ônibus em Londres caíram 56% entre 2013 e 2015, “coincidind­o com a redução no número de pagamentos de passagens em cash”. Aqui, como lá, acabar com o cobrador e com pagamentos em dinheiro é fundamenta­l não só pela economia, mas também para a segurança dos usuários.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil