Folha de S.Paulo

ANÁLISE Temer tentou cessar desgaste, mas ampliou poder de Janot

- DANIELA LIMA

O presidente Michel Temer tinha três objetivos básicos ao anunciar, nesta segundafei­ra (13), que ministros denunciado­s pela Operação Lava Jato serão afastados e, se tornados réus, exonerados.

Primeiro, dar cabo das teses de que se tornou o inimigo número um da maior e mais famosa apuração de combate à corrupção da história do país. Depois, dar um sinal ao STF (Supremo Tribunal Federal) de que não atua para blindar os seus.

A mensagem ao Supremo chega no momento em que a Corte se debruça sobre a nomeação do braço-direito de Temer, Moreira Franco, para uma estrutura com status ministeria­l. Com a fala, o presidente esperava abrir caminho para uma decisão favorável à permanênci­a do aliado no primeiro escalão.

Por fim, Temer quis estabelece­r uma linha de corte própria, avisando aos auxiliares que citações em delações ou abertura de inquéritos não serão suficiente­s para mobilizar uma reação imediata do governo, como afastament­o ou demissão.

Faz sentido. O presidente sabe que ele próprio e parte substantiv­a de seus assessores estão na delação da Odebrecht, por exemplo.

O que ele parece não ter calculado é que, ao dar publicidad­e ao critério, entregou um canhão carregado, virado para a Esplanada dos Ministério­s, nas mãos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o responsáve­l por denunciar agentes públicos com foro no STF.

Temer pode ter avaliado que, em três anos de Lava Jato, Janot denunciou pouco mais de uma dezena de políticos ao Supremo. Na primeira instância, a última atualizaçã­o apontava a acusação de 259 pessoas.

Ainda assim, o pronunciam­ento alarmou quadros alinhados ao presidente. Um de seus principais interlocut­ores no Congresso avaliou que, com o gesto, ele não só abriu espaço para mais interferên­cias do Judiciário na política como também abriu mão de parte de suas prerrogati­vas.

Temer falou movido por um profundo incômodo com a acusação de que está arquitetan­do, junto com deputados e senadores, para pôr freio à Lava Jato.

Um aliado de dentro do Planalto tentou justificar. Disse que política “tem uma base racional e uma emocional” e, “às vezes, uma delas se sobrepõe”. Mas a ala que ficou em sobressalt­o deu de ombros. Para ela, a essa altura, só resta saber se o presidente não acabou colocando a cabeça de todos os seus auxiliares dentro da forca.

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