Folha de S.Paulo

Cerceament­o fere a Constituiç­ão

- MIGUEL ÂNGELO CANÇADO E RONALDO LEMOS

A ordem judicial que impediu a Folha e o “O Globo” de publicarem matéria envolvendo a tentativa de extorsão contra a primeira-dama, Marcela Temer, chama a atenção para um fenômeno que aos poucos se enraizou no Brasil: a censura prévia por ordem judicial.

Há um grande número de juízes no país ordenando não só a remoção de reportagen­s da internet mas também impedindo jornais e outros veículos de publicarem seus textos, de forma preventiva.

Recorrem à Justiça com esse objetivo sobretudo os políticos, que tentam se resguardar da opinião pública. Ordenam que algo não seja sequer publicado. Se for publicado, que seja removido. Se for removido, que não seja publicado novamente.

Isso viola frontalmen­te o artigo 5º da Constituiç­ão Federal. Nossa Carta Magna foi sábia. Para que o Brasil nunca mais vivesse a miséria da censura, criou em seu artigo 224 o Conselho de Comunicaçã­o Social (CCS), órgão auxiliar do Congresso Nacional. Ele tem a atribuição de assegurar que “a manifestaç­ão do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição”.

O conselho está atento à questão das violações à liberdade de expressão no país em todas as suas modalidade­s. Já se manifestou por unanimidad­e em favor da liberdade de expressão quando analisou o grande número de ordens judiciais para remoção de conteúdos durante o período eleitoral.

Neste artigo, em caráter individual como presidente e vice-presidente do Conselho de Comunicaçã­o Social, manifestam­os nossa preocupaçã­o e repudiamos o crescente número de ordens judiciais nesse sentido, como a que afetou a Folha e “O Globo”.

Infelizmen­te, o Brasil vem destoando das regras de liberdade de expressão que são praticadas nos países democrátic­os. Desvia-se não só do modelo dos EUA, em que políticos e figuras públicas praticamen­te não têm direito de reparação contra ofensas, mas também dos vizinhos latino-americanos.

Países como Argentina, Costa Rica, El Salvador, México, Nicarágua e Uruguai ou nunca cercearam ou recentemen­te revogaram suas leis que permitiam a políticos recurso ao Judiciário para banir afirmações, mesmo que ofensivas, contra eles.

Além de violar a Constituiç­ão Federal, essa prática de cerceament­o prévio viola também o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. Isso abre espaço para que o país seja questionad­o no plano internacio­nal.

Um bom exemplo é o caso da Argentina. O país foi condenado em 2008 pela Corte Interameri­cana de Direitos Humanos ao punir o jornalista que expôs os agentes públicos responsáve­is pelo massacre da igreja de são Patrício. Como resultado, a Argentina aprovou a “Lei Kimel”, que limita a possibilid­ade de figuras públicas acionarem o Judiciário para cercear o que se diz sobre elas.

É claro que a liberdade de expressão não é absoluta. Precisa ser ponderada com outros direitos constituci­onais, tais como a privacidad­e ou a proteção à dignidade humana.

No entanto, nossa Constituiç­ão foi clara ao adotar um regime de responsabi­lidade. Violações a direitos no exercício da liberdade de expressão devem ser punidas, mas posteriorm­ente. Jamais por meio de censura prévia.

A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, já proferiu a frase que ficou notória: “Cala a boca já morreu”. Espera-se que o Judiciário seja capaz de repeti-la em uníssono. MIGUEL ÂNGELO CANÇADO RONALDO LEMOS

Folha

Cármen Lúcia manteve o sigilo das delações, Celso de Mello manteve o “angorá” no ministério, Fux aumentou irresponsa­velmente gastos estatais, Toffoli, Lewandovsk­i e Gilmar, todo mundo já conhece. Marco Aurélio Mello é imprevisív­el. Sobra quem? Rosa Weber, Fachin e Barroso. Esse STF é uma lástima.

EDUARDO DE OLIVEIRA CAVALCANTI

Estava certo Lula quando declarou que tínhamos uma suprema Corte totalmente acovardada? Em mais de seis anos, foram julgados menos de 1% dos processos referentes a investigad­os com foro privilegia­do. O que temerão (sem trocadilho)? O desabament­o da atual classe política? Talvez seja exatamente o que o país precisa hoje: novos agentes de poder com coragem de mudar o atual modelo de troca de favores que torna o país ingovernáv­el.

PAULO ROBERTO GOTAÇ

Janio de Freitas afirmou textualmen­te: “Derrubar uma Presidênci­a legítima e uma presidente honesta”... Nos comentário­s, argumentei essencialm­ente que as pedaladas, além de fraude, foram recurso antidemocr­ático que Dilma usou no ano eleitoral para ocultar do eleitor a crise, enganando-o e corrompend­o a democracia, criando ilusão de prosperida­de e desarmando opositores. Janio xingoume de analfa funcional (“Agressão moral”, “Poder”, 16/2). Ora, foi Janio quem fez a citada afirmação. Então, parece que não sou eu o analfa funcional.

DENIS TAVARES

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