Folha de S.Paulo

Como ministro, Roberto Freire deveria ter expressado seu respeito ao grande Raduan Nassar, mesmo discordand­o de suas opiniões.

- MARIO CESAR CARVALHO GABRIELA SÁ PESSOA

DE SÃO PAULO

Três meses depois de ser dispensado de usar tornozelei­ra eletrônica, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa descobriu que pode acabar preso por até oito anos se o juiz Sergio Moro aceitar um pedido do Ministério Público Federal.

O procurador Deltan Dellagnol, coordenado­r das investigaç­ões da Lava Jato em Curitiba, pediu ao juiz para “desconside­rar” os benefícios que Costa e seus familiares ganharam por colaborar com as apurações, porque ele teria mentido em relação a valores que foram tirados do seu escritório por suas filhas. A informação foi revelada pelo site “BuzzFeed”.

É a primeira vez que procurador­es pedem a suspensão de benefícios de um delator da Lava Jato. Outros delatores e empresas omitiram fatos, mas não tiveram seus benefícios questionad­os.

Caso o juiz aceite o pedido do procurador, os depoimento­s de Costa continuam válidos. A lei brasileira que regulament­ou a delação premiada, de 2013, prevê que, caso o delator perca os benefícios por mentir, tudo o que ele revelou pode continuar sendo usado em ações penais.

O ex-diretor, que ficou cinco meses preso em 2014, foi o primeiro delator da operação e revelou informaçõe­s considerad­as estratégic­as para o sucesso da investigaç­ão.

Ele foi o primeiro a dizer que a propina paga por empresas contratada­s pela Petrobras variava de 1% a 3% do valor do contrato. Também revelou que o suborno era repartido por partidos que indicavam diretores, como PT, PP e PMDB.

Costa se tornou diretor de Abastecime­nto em 2004, indicado pelo PP, um dos partidos da base do primeiro governo Lula. Ficou até 2012.

Ele cumpriu dois anos de prisão domiciliar no Rio de Janeiro e tirou sua tornozelei­ra em novembro do ano passado. Atualmente, sua única obrigação com a Justiça é prestar quatro horas semanais de serviços comunitári­os até novembro de 2019. ESCONDE-ESCONDE Os fatos que podem complicar o réu remetem ao primeiro dia da Lava Jato, em 2014. Dallagnol afirma que o execu-

Pedi para ela [Arianna] ir ao escritório pegar alguma coisa entre R$ 50 mil. Ela pegou esse dinheiro, uma tabela e os relatórios de Beto. Não é o Alberto Youssef, é o Beto, meu genro. Juiz: O senhor pediu para ela ir até lá para a polícia não encontrar esse documento e esse dinheiro, é isso? Costa: Não lembrava desse documento, a única coisa que pedi foi para pegar o dinheiro ARIANNA COSTA (Em interrogat­ório) Procurador: Houve alguma orientação dele? Arianna: Não, orientação nenhuma, não sei se ele me ligou para falar que o pessoal estava indo com ele ao escritório PAULO ROBERTO COSTA Em interrogat­ório, Costa diz que conversou só com Arianna no início da manhã SHANNI COSTA (Em interrogat­ório) Procurador: Algum dos senhores conversou com o Paulo Roberto no dia? Shanni: Não recebi nenhuma ligação do meu pai, não falei com ele nenhuma vez. Eu recebi uma única ligação da minha irmã SHANNI COSTA (Em interrogat­ório) Juiz: E essas contas do seu pai lá fora? Shanni: Também não, não sabia. Juiz: Pediu para a senhora assinar documentos para abrir conta fora? Shanni: Não, não, no meu nome não tivo e seus familiares “impediram e embaraçara­m” as investigaç­ões em 17 de março daquele ano, quando a operação foi desencadea­da.

Enquanto a Polícia Federal fazia buscas na casa de Costa, na Barra da Tijuca, suas filha e um dos seus genros retiraram dinheiro em espécie e documentos que estavam na empresa do executivo.

Costa reconheceu depois que ele próprio orientara suas duas filhas, Arianna Costa e Shanni Costa, e o genro Marcio Lewkowicz, marido de Arianna, a ocultar provas.

O ex-diretor relatou no acordo de delação que entregou discretame­nte a Arianna as chaves de sua empresa para que ela buscasse lá R$ 50 mil. Depois, disse que pediu US$ 10 mil e R$ 100 mil, além de duas planilhas.

O procurador afirma que a família mentiu “diversas vezes” em seus interrogat­órios e elencou uma série de contradiçõ­es nos depoimento­s.

Outras supostas contradiçõ­es envolvem as contas bancárias secretas das filhas do executivo. Primeiro, Shanni e Arianne disseram não ter contas no exterior. Depois, Shanni contou que, quando o pai saiu da Petrobras, pediu os passaporte­s dela, da irmã e dos maridos para abrir contas nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal no Caribe.

Após o acordo de delação, Costa devolveu a R$ 79 milhões que estavam em contas na Suíça e nas Ilhas Cayman. Perdeu outros R$ 4,9 milhões em bens como um terreno no litoral do Rio, uma lancha e um jipe Land Rover Evoque.

Seu advogado, Cássio Quirino Norberto, disse à Folha não haver motivo romper o acordo com a Lava Jato: “Vamos explicar tudo nas alegações finais e confirmare­mos o que consta do acordo de delação do Paulo. O acordo é hígido e válido”.

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