Folha de S.Paulo

ANÁLISE Sai do poder um populista, mas o populismo continuará vivo

- 2015 2016 CLÓVIS ROSSI

23,3 22,9 -2,3*

FOLHA

As eleições de domingo (19) no Equador concretiza­m o fim de mais um líder populista, no caso Rafael Correa, há 10 anos no poder, mas estão longe de representa­r também o fim do populismo, essa caracterís­tica tão marcante da América Latina.

É paradoxal, aliás, a ascensão de populistas como Donald Trump nos EUA e outros líderes dessa estirpe na Europa, exatamente no momento em que parecem em declínio no seu principal celeiro.

No Equador, o populismo de Correa teve efeitos estabiliza­dores inegáveis: nos dez anos anteriores a ele, houve oito presidente­s. Ele, ao contrário, ficou no poder durante os dez anos seguintes.

Seu candidato, Lenín Moreno, tem cerca de um terço dos votos, segundo as pesquisas. Supera qualquer adversário. É razoável supor, no entanto, que os dois terços restantes darão a vitória à oposição no segundo, provavelme­nte ao banqueiro Guillermo Lasso.

Há duas maneiras de olhar a provável derrota do populismo no Equador. Shannon O’Neil, competente analista de América Latina, escreve: “A história mostra que o populismo polariza sociedades, enfraquece as economias e mina a democracia representa­tiva”. Não é bem assim: a polarizaçã­o, de fato, é evidente em todos os países que têm ou tiveram governos populistas, Brasil inclusive. Mas nem sempre a economia se enfraquece­u. No Equador, até 2015, os anos Correa foram de bonança, a ponto de só registrar recessão em 2016.

Quanto à democracia representa­tiva, Correa limitou a liberdade de expressão, o que é lamentável, mas não basta para rotular seu reinado como uma ditadura.

O lado positivo, que dá vida ao populismo, é o esforço social: no caso do Equador, a pobreza caiu de 49,1% em 2003 para 27,3% em 2012. Criou, com isso, um reservatór­io de votos, ainda majoritári­o, embora talvez não suficiente para assegurar a vitória.

Caberá a Lasso, se ganhar, assim como ao argentino Mauricio Macri, provar que não-populistas podem fortalecer a economia e a democracia, sem esquecer a massa de deserdados que continua como a veia aberta da América Latina, para citar o uruguaio Eduardo Galeano, morto há dois anos.

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