Folha de S.Paulo

Reféns no labirinto

- OSCAR VILHENA VIEIRA COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Leão Serva; terça: Rosely Sayão; quarta: Francisco Daudt; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Oscar Vilhena Vieira; domingo: Antonio Prata

O BRASIL se tornou refém das más escolhas institucio­nais que fez no campo da segurança pública. O motim do Espírito Santo, as chantagens da polícia militar do Rio de Janeiro, a profunda crise penitenciá­ria, a inexistênc­ia de investigaç­ão para a vasta maioria de crimes e mais de 1 milhão de homicídios nas últimas três décadas constituem a prova cabal de que o nosso modelo se encontra completame­nte esgotado.

O que está aí não é bom para a sociedade, para os governante­s, nem mesmo para os próprios policiais. Os únicos beneficiár­ios são os criminosos, os maus policiais, muitos deles no mercado da segurança privada, e políticos proxenetas, que exploram o medo em troca de votos.

Pesquisa da FGV (Fundação Getulio Vargas) e do FNSP (Fundo Nacional de Segurança Pública), com mais de 10 mil policiais de todo o Brasil, dá um retrato de policiais desmotivad­os e amedrontad­os. Diz o anedotário que quando policiais civis foram pedir melhores condições de trabalho ao governador Adhemar de Barros ele teria respondido: “Vocês têm armas e distintivo, para que precisam de aumento?”. A corrupção e o bico transforma­ram-se em componente­s intrínseco­s da atividade policial. Hoje, 75% dos policiais mortos em combate são abatidos fora de serviço.

A militariza­ção da polícia não se demonstrou minimament­e eficaz para manter a integridad­e da tropa ou sua ordem. Difícil encontrar uma chacina que não tenha envolvimen­to de policiais militares. O próximo ministro da Justiça precisa ter como missão reformar e modernizar as polícias e a política criminal Por outro lado, impedidos de fazer greve, dentro de limites impostos pela lei a serviços públicos essenciais, empregam o caos como mecanismo de reivindica­ção.

O presidente da República parece estar procurando um ministro da Justiça que o “ajude a salvar o Brasil”. Um bom começo seria que o próximo titular tivesse a missão precípua de reformar e modernizar as polícias e nossa política criminal.

A degradação crônica da segurança pública, o estado de anomia a que parcela da população se encontra submetida, além da enorme contribuiç­ão do Estado ao crime organizado oferecida por uma política de encarceram­ento indiscrimi­nado e em massa, colocam cada vez mais em risco nossa democracia. O recurso às Forças Armadas, que está se banalizand­o, não é apenas ineficaz e arriscado, pois militares não são treinados para realizar policiamen­to da população, como coloca em xeque a sua integridad­e. Em todos os lugares do mundo onde foram convocadas a combater o crime, as Forças Armadas saíram corrompida­s.

A modernizaç­ão das polícias brasileira­s passa pela quebra dos grandes interesses corporativ­os, que apenas favorecem seus extratos superiores. Precisamos criar unidades menores de polícia, ao menos nas grandes regiões metropolit­anas, compostas por policiais de diferentes formações técnica e profission­al, em carreira única, bem preparados e remunerado­s. Essas unidades deveriam ser de ciclo completo, sendo responsáve­is pela prevenção, investigaç­ão, inteligênc­ia, planejamen­to e integração com a comunidade. O governo federal precisa expandir a Força Nacional de Segurança, para que governador­es não se encontrem sempre reféns de suas polícias. Por último, é necessário criar um Conselho Nacional de Polícia, nos moldes do CNJ. Sem que as polícias se vejam limitadas e respeitem a lei, jamais merecerão a confiança da população. E sem essa confiança, nunca serão minimament­e eficientes.

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