Folha de S.Paulo

Perspectiv­as de acordo para obter plasma são boas, afirma instituto

- EDUARDO GERAQUE ROGÉRIO GENTILE

DE SÃO PAULO

Em 2008, o Instituto Butantan começou a construir o que seria a primeira fábrica de derivados de sangue no país —um dia histórico nas palavras do então governador José Serra (PSDB/SP).

Nove anos e R$ 239,4 milhões em verbas públicas depois, nenhuma única gota de plasma foi processada ainda na instalação, hoje um grande “elefante branco”.

Com cerca de 10 mil metros quadrados, a unidade deveria estar funcionand­o desde 2010, produzindo medicament­os importante­s, hoje importados, para o tratamento de doenças como hemofilia e Aids.

À época, o governo de São Paulo, ao qual o instituto é vinculado, tinha a expectativ­a de que 150 mil litros de plasma fossem processado­s anualmente na planta.

“A fábrica será construída mesmo que os recursos partam exclusivam­ente do tesouro estadual”, afirmou Serra na assinatura do contrato. “A gente sabe que aqui no Butantan qualquer investimen­to dá certo”, declarou.

A história, no entanto, mostra que nem tudo funciona tão bem assim por lá. Auditoria obtida pela Folha revela que houve erros de planejamen­to no projeto e que, para a fábrica entrar em operação, será necessário gastar mais R$ 437,6 milhões.

A atual direção do instituto diz que o valor passa por revisão e que será menor. ERROS O principal erro encontrado pela Colorado Consultori­a Contábil, que a pedido do governo analisou a situação do instituto presidido pelo imunologis­ta Jorge Kalil, é pueril: a falta de matéria-prima.

Segundo a auditoria, R$ 239,4 milhões foram gastos sendo que até hoje “não foi equacionad­o o acesso do Butantan ao plasma para fracioname­nto”, o que impede o prosseguim­ento do projeto.

O país produz, a partir da doação voluntária de sangue, cerca de 400 mil litros de plasma em condições de utilização terapêutic­a. A lei

DE SÃO PAULO

A direção do Instituto Butantan, órgão ligado ao governo paulista, afirma que são boas as perspectiv­as de um acordo com a União para a disponibil­ização do plasma, sem o qual a fábrica não terá como entrar em operação.

O valor para o término das obras, calculado em R$ 437,6 milhões pela auditoria contratada pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB), está sendo revisto, segundo o instituto. “Será inferior”, afirmou a direção do Butantã, em nota.

O instituto, que considera a fábrica imprescind­ível, dado que o Brasil depende ainda hoje de importaçõe­s para o tratamento de hemofílico­s, afirma, no entanto, não ter uma nova previsão para o início da operação. Quando o projeto foi anunciado publicamen­te pelo então governador Serra, a data era 2010.

O instituto diz que não procede a crítica feita pelos auditores à capacidade de processame­nto de plasma da fábrica. “A planta tem capacidade teórica de processar 200 mil litros/ano, mas pode ser expandida num curto prazo para 500 mil litros/ano.” (ED E RG) impede que o plasma a ser processado­s seja comprado.

Pelo acordo do Butantan com o governo federal, o instituto só pode ter acesso ao que exceder ao suprimento da Hemobras (empresa da União, localizada em Pernambuco), estipulado em 500 mil litros/ano.

Ou seja, como não havia (e nem há ainda hoje) matériapri­ma garantida para o Butantan, a montagem da fábrica foi paralisada em 2010.

Com isso, equipament­os comprados há mais de seis anos estão guardados e, segundo a auditoria, “desconhece-se o seu estado operaciona­l visto que, neste intervalo, não foram realizadas inspeções ou manutençõe­s”.

O Butantan alega que o governo federal havia se comprometi­do a fornecer o plasma necessário quando a fábrica entrasse em operação, mas depois passou a priorizar a Hemobras.

Outro problema, de acordo com a auditoria, decorre do fato de que o instituto optou por utilizar uma tecnologia inovadora, mas que nunca fora implementa­da em larga escala em lugar algum. A capacidade de processame­nto dessa tecnologia, afirma o documento, é inferior à necessidad­e do país.

A empresa que examinou o Butantan entende que outra grande deficiênci­a do projeto foi o aspecto econômico-financeiro. “Não foram apresentad­os estudos de viabilidad­e, o que leva à dúvida se foram feitos”, diz. “Se foram, certamente não foram feitos de forma profission­al.” COMPOSIÇÃO DO SANGUE A lei brasileira impede que o plasma sanguíneo seja comprado por quem for produzir os hemoderiva­dos. A única fonte do plasma é via doação de sangue

Quais são os principais produtos feitos a partir do plasma e para que servem ↳

A proteína albumina é indicada para nefropatia e queimadura­s, por exemplo

Os fatores 8 e 9 da coagulação são usados em prevenção e tratamento de sangrament­o em pacientes com hemofilia

↳ Como o plasma é obtido

A imunoglobu­lina é usada em pessoas com problemas imunológic­os, como os portadores do HIV

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