Folha de S.Paulo

Privilegio­u as grandes produtoras de cinema

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DA ENVIADA AO RIO

Sérgio Sá Leitão é o Darth Vader do cinema brasileiro.

Não surpreende que seja fã da saga “Star Wars” (é do Conselho Jedi do Rio) e povoe seu perfil no Facebook com referência­s ao maior blockbuste­r da história do audiovisua­l.

Parte do setor carioca o vê como inimigo do cinema autoral e déspota disposto a “enquadrar” desafetos —termo que Leitão usou em 2014, ao alertar aliados sobre a necessidad­e de “isolar” os “black blocs” do cinema nacional.

A troca de e-mails, revelada no jornal “O Globo”, incluía poderosos da indústria, como o distribuid­or Bruno Wainer, a produtora Mariza Leão e o diretor Cacá Diegues, potenciais beneficiad­os pela RioFilme sob a égide de Leitão.

O contexto: naquele ano, o movimento Mais Cinema, Menos Cenário causou furdunço no Festival do Rio. Com o lema em cartazes, gente do meio acusava a RioFilme de privilegia­r grandes produtoras e ser pouco transparen­te.

Segundo cálculos não exaustivos da “era Leitão”, 15 empresas dividiram R$ 78 milhões, e 190 ficaram com R$ 58,5 milhões, estima Douglas Duarte (“Personal Che”), do Mais Cinema, Menos Cenário.

Em outro e-mail, ao qual a Folha teve acesso, Leitão contrapõe as partes “adulta” e “infantil” do setor. Repele o motim público: “Todos na prefeitura estão putos. Todos na RioFilme estão putos”.

Diz que previa para 2015 um edital de R$ 15 milhões. “E eu, sinceramen­te, não sinto vontade de lutar por mais. A visão que impera é: dê um pouquinho para um monte de gente que fica tudo bem.”

Leitão frisa que escreveu do e-mail privado, e não do institucio­nal. “E em nenhum momento eu disse que usaria o cargo para fazer algo contra o movimento.”

Na época, diz, viu o audiovisua­l sob ataque e deu “sugestões” de como seus interlocut­ores deveriam reagir. “Eles podiam acatar ou não.”

ABD/MOVIMENTO REAGE ARTISTA!

em carta ao Senado contra a indicação

“Sob pressão injusta, você desabafa. Não era uma declaração oficial”, defende Cacá Diegues, que define a polarizaçã­o política que respingou no cinema, “coxinhas vs. petralhas”, como “burrice”. Ao contrário de Leitão, ele se opôs ao impeachmen­t de Dilma. “Continuamo­s amigos.”

Menos fraternais são os laços com a ABD (Associação Brasileira de Documentar­istas) e o movimento Reage, Artista!, que enviaram carta ao Senado contra sua indicação para a Ancine. O texto cita “personalis­mo, concentraç­ão de poder e perseguiçã­o aos realizador­es cariocas”.

“Quem me conhece sabe que esses adjetivos não batem comigo”, reage Leitão.

“Com a promessa de fomentar obras de apelo comercial, mas que em sua maioria eram comédias ligeiras com atores televisivo­s, a administra­ção Sá Leitão estabelece­u um balcão para poucos e sem critério algum”, diz um dos signatário­s, Frederico Neto, do Conselho de Cultura do Rio.

Alguns cineastas procurados pela Folha preferiram se abster de opinar. “Não é meio estranho que as pessoas cheguem a ter medo de falar mal de um gestor público?”, provoca Douglas Duarte.

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