Você receberia prêmio de governo golpista?
Se Raduan pode falar, se a plateia pode vaiar, também quero me expressar sem ser bombardeada pela torcida louca do burro-petismo
“Você receberia um prêmio de um governo golpista?” Essa foi a pergunta que eu tive a sandice de colocar na minha página do Facebook depois do ocorrido na entrega do Prêmio Camões a Raduan Nassar.
Uma pergunta sincera e legítima que, claro, trazia embutida minha resposta. Eu não receberia prêmio de um governo que deu um golpe, agiu em desacordo com a Constituição, tirou uma presidente que eu julgava íntegra e honesta e tem feito tantas barbaridades.
Deus me livre de receber um prêmio dessa gente. Caso eu estivesse muito dura e não pudesse me dar ao luxo de recusar a grana —ou caso eu achasse que minha obra vale 100 mil euros, venham eles de onde vierem—, eu pediria à comissão que depositasse o montante na minha conta e desse o assunto por encerrado. Sem festa nem discurso.
Os primeiros comentários na minha página foram civilizados e tentavam me esclarecer: 1) O prêmio foi dado no governo Dilma Rousseff (mas ela já estava afastada na ocasião); 2) Quem deu o prêmio foi o Estado, não o governo.
Só que aí os comentários foram subindo de tom, e a minha página virou um lamaçal de ofensas e barbaridades. A alcateia petista ignara babava e soltava fogo pelas ventas.
Como eu dou um boi para não entrar numa briga e uma boiada para sair dela o mais rápido possível, deletei o post. Vade retro! Voltem para o inferno de onde vocês saíram. Afasta de mim, ó Pai, o visgo fétido que os fascistas intolerantes espalham por onde andam. Fascistas, é esse o nome de quem não admite que você tenha opinião contrária.
Sim, Raduan é um de nossos maiores escritores vivos e merece todo o meu respeito. A devoção que tenho por seus livros é inatingível e inatacável. Sendo ele quem é, pode falar o que quiser. Mesmo eu não concordando com uma só palavra, dou risada e deixo para lá. O máximo que posso pensar é: os autores geniais são homens comuns, tão sujeitos a falhas quanto qualquer outro.
Já o discurso do ministro da Cultura, Roberto Freire, me fez morrer de vergonha, para dizer o mínimo. É inadmissível que um ministro que estava ali para entregar um prêmio se meta num bate-boca ridículo e palanqueiro como aquele.
Também foi lamentável a reação da plateia. Ok, eram todos petistas, estavam ali para render graças ao escritor petista, mas as vaias e palavras de ordem foram tão ridículas e inapropriadas quanto as do ministro.
Raduan assistiu impávido a um espetáculo lamentável. Note-se que, em seu pronunciamento, não falou sobre literatura. Aliás, só saiu da toca porque viu ali ótima oportunidade para fazer seu discurso político.
Ora, se Raduan pode falar, se o ministro pode falar (ou quase), se a plateia pode vaiar, eu também quero expressar minha opinião sem ser bombardeada pela torcida enlouquecida do burro-petismo.
Quase todos os meus amigos são petistas. No meio literário contam-se nos dedos de uma só mão os que têm coragem de dizer que sonham com o dia em que Lula fará companhia a José Dirceu nos banhos de sol matinais.
Mesmo assim, somos (ou éramos) capazes de sentar num boteco e discutir a premiação do Raduan até altas horas entre gritos, dedos na cara, deboches e incontáveis baldes de cerveja. No final, sairíamos todos bêbados e tão amigos quanto antes.
Mas parece que discussão analógica virou coisa fora de moda. Agora a onda é escrever no Facebook o que pensamos, correndo o risco de levar chicote no lombo caso nossa opinião não esteja dentro do que preconiza o missal da estrela vermelha.
A sorte é que sempre tem um “jornal golpista” que dá espaço para desabafarmos. IVANA ARRUDA LEITE, Agricultura Oportuna, pela lucidez, a publicação do editorial “Salva-se a lavoura” (“Opinião”, 22/2). Realmente, o setor tem sido decisivo para o país. Aliás, destaco a reportagem “Agricultura se recupera e anima o campo” (“Mercado”, 19/2) e o artigo “Os desafios do agronegócio”, assinado pelo governador Geraldo Alckmin (“Tendências/Debates”, 19/2). Temos a preocupação com a logística de escoamento, e destaco a inovação gerada pelos institutos de pesquisa da secretaria. Mas a atenção com a taxa de câmbio e a necessidade de que o Plano Safra seja plurianual são fundamentais.
ARNALDO JARDIM,
LEIA MAIS CARTAS NO SITE DA FOLHA - SERVIÇOS DE ATENDIMENTO AO ASSINANTE: OMBUDSMAN: Manicômio Por favor, assistam ao documentário “Holocausto Brasileiro” e acabem de vez com esses hospícios. Nunca assisti a tanto sofrimento de pessoas reunidas. Um verdadeiro holocausto. Tenham compaixão! (“Sem saída”, “Cotidiano”, 22/2).
ELITON ROSA
Folha, 96 A Folha agradece as mensagens pelos seus 96 anos recebidas de Rodney Vergili, diretor da Digital Assessoria - Comunicação Integrada (São Paulo, SP), e de Ângela Luiza S. Bonacci (Pindamonhangaba, SP).