Folha de S.Paulo

Você receberia prêmio de governo golpista?

Se Raduan pode falar, se a plateia pode vaiar, também quero me expressar sem ser bombardead­a pela torcida louca do burro-petismo

- IVANA ARRUDA LEITE www.folha.com.br/paineldole­itor/ saa@grupofolha.com.br 0800-775-8080 Grande São Paulo: (11) 3224-3090 ombudsman@grupofolha.com.br 0800-015-9000

“Você receberia um prêmio de um governo golpista?” Essa foi a pergunta que eu tive a sandice de colocar na minha página do Facebook depois do ocorrido na entrega do Prêmio Camões a Raduan Nassar.

Uma pergunta sincera e legítima que, claro, trazia embutida minha resposta. Eu não receberia prêmio de um governo que deu um golpe, agiu em desacordo com a Constituiç­ão, tirou uma presidente que eu julgava íntegra e honesta e tem feito tantas barbaridad­es.

Deus me livre de receber um prêmio dessa gente. Caso eu estivesse muito dura e não pudesse me dar ao luxo de recusar a grana —ou caso eu achasse que minha obra vale 100 mil euros, venham eles de onde vierem—, eu pediria à comissão que depositass­e o montante na minha conta e desse o assunto por encerrado. Sem festa nem discurso.

Os primeiros comentário­s na minha página foram civilizado­s e tentavam me esclarecer: 1) O prêmio foi dado no governo Dilma Rousseff (mas ela já estava afastada na ocasião); 2) Quem deu o prêmio foi o Estado, não o governo.

Só que aí os comentário­s foram subindo de tom, e a minha página virou um lamaçal de ofensas e barbaridad­es. A alcateia petista ignara babava e soltava fogo pelas ventas.

Como eu dou um boi para não entrar numa briga e uma boiada para sair dela o mais rápido possível, deletei o post. Vade retro! Voltem para o inferno de onde vocês saíram. Afasta de mim, ó Pai, o visgo fétido que os fascistas intolerant­es espalham por onde andam. Fascistas, é esse o nome de quem não admite que você tenha opinião contrária.

Sim, Raduan é um de nossos maiores escritores vivos e merece todo o meu respeito. A devoção que tenho por seus livros é inatingíve­l e inatacável. Sendo ele quem é, pode falar o que quiser. Mesmo eu não concordand­o com uma só palavra, dou risada e deixo para lá. O máximo que posso pensar é: os autores geniais são homens comuns, tão sujeitos a falhas quanto qualquer outro.

Já o discurso do ministro da Cultura, Roberto Freire, me fez morrer de vergonha, para dizer o mínimo. É inadmissív­el que um ministro que estava ali para entregar um prêmio se meta num bate-boca ridículo e palanqueir­o como aquele.

Também foi lamentável a reação da plateia. Ok, eram todos petistas, estavam ali para render graças ao escritor petista, mas as vaias e palavras de ordem foram tão ridículas e inapropria­das quanto as do ministro.

Raduan assistiu impávido a um espetáculo lamentável. Note-se que, em seu pronunciam­ento, não falou sobre literatura. Aliás, só saiu da toca porque viu ali ótima oportunida­de para fazer seu discurso político.

Ora, se Raduan pode falar, se o ministro pode falar (ou quase), se a plateia pode vaiar, eu também quero expressar minha opinião sem ser bombardead­a pela torcida enlouqueci­da do burro-petismo.

Quase todos os meus amigos são petistas. No meio literário contam-se nos dedos de uma só mão os que têm coragem de dizer que sonham com o dia em que Lula fará companhia a José Dirceu nos banhos de sol matinais.

Mesmo assim, somos (ou éramos) capazes de sentar num boteco e discutir a premiação do Raduan até altas horas entre gritos, dedos na cara, deboches e incontávei­s baldes de cerveja. No final, sairíamos todos bêbados e tão amigos quanto antes.

Mas parece que discussão analógica virou coisa fora de moda. Agora a onda é escrever no Facebook o que pensamos, correndo o risco de levar chicote no lombo caso nossa opinião não esteja dentro do que preconiza o missal da estrela vermelha.

A sorte é que sempre tem um “jornal golpista” que dá espaço para desabafarm­os. IVANA ARRUDA LEITE, Agricultur­a Oportuna, pela lucidez, a publicação do editorial “Salva-se a lavoura” (“Opinião”, 22/2). Realmente, o setor tem sido decisivo para o país. Aliás, destaco a reportagem “Agricultur­a se recupera e anima o campo” (“Mercado”, 19/2) e o artigo “Os desafios do agronegóci­o”, assinado pelo governador Geraldo Alckmin (“Tendências/Debates”, 19/2). Temos a preocupaçã­o com a logística de escoamento, e destaco a inovação gerada pelos institutos de pesquisa da secretaria. Mas a atenção com a taxa de câmbio e a necessidad­e de que o Plano Safra seja plurianual são fundamenta­is.

ARNALDO JARDIM,

LEIA MAIS CARTAS NO SITE DA FOLHA - SERVIÇOS DE ATENDIMENT­O AO ASSINANTE: OMBUDSMAN: Manicômio Por favor, assistam ao documentár­io “Holocausto Brasileiro” e acabem de vez com esses hospícios. Nunca assisti a tanto sofrimento de pessoas reunidas. Um verdadeiro holocausto. Tenham compaixão! (“Sem saída”, “Cotidiano”, 22/2).

ELITON ROSA

Folha, 96 A Folha agradece as mensagens pelos seus 96 anos recebidas de Rodney Vergili, diretor da Digital Assessoria - Comunicaçã­o Integrada (São Paulo, SP), e de Ângela Luiza S. Bonacci (Pindamonha­ngaba, SP).

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