Mágoa pode ter levado à demissão de ex-Butantan
Secretário da Saúde e Jorge Kalil teriam rixas
A demissão de Jorge Kalil do cargo de diretor do Instituto Butantan (IB) pode estar relacionada a uma antiga mágoa cultivada entre ele e o secretário da Saúde do Estado de São Paulo, David Uip, segundo médicos próximos aos dois ouvidos pela Folha.
Os dois trabalharam juntos no Incor (Instituto do Coração) do Hospital das Clínicas quando Uip era subordinado a Kalil, que ocupava as presidências do conselho diretor do InCor e do conselho consultivo da Fundação Zerbini.
Em 2008, Uip deixou a diretoria-executiva do InCor, cargo que havia ocupado durante cinco anos, e teria se ressentido da falta de apoio de Kalil, até então seu amigo próximo, para que ele permanecesse na instituição.
Outra situação que teria irritado Uip era o fato de que Kalil não obedecia a hierarquia, ligando diretamente para o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e ministros para tratar de questões do Butanan, sem passar pelo secretário, a quem era subordinado.
Em entrevista à Folha, David Uip nega que a exoneração tenha motivação pessoal. “Não tenho nenhuma mágoa do Kalil. Zero de mágoa. Fomos grandes parceiros na época do Incor”, diz. O secretário diz que está “muito triste” com a situação.
“Ele é um baita cientista, um dos melhores do mundo. Mas as colisões do ponto de vista de gestão se tornaram insustentáveis”, afirma Uip.
Kalil também conversou com a Folha, por telefone. “Estou triste e indignado. Dediquei minha vida à ciência e tecnologia. Na última fase de minha carreira, resolvi me dedicar a um instituto que fosse útil, que fizesse algo para a sociedade”, diz.
Ele diz que o desejo de Alckmin de que ele continue à frente da pesquisa da vacina da dengue é atestado de sua competência e idoneidade.
Entre os sucessos de sua gestão, enumera, estão a modernização da infraestrutura, a multiplicação das receitas, o direcionamento de verbas para a pesquisa e o prestígio internacional do Butantan.
Segundo Uip, os problemas de incompatibilidade começaram com o acúmulo de função por parte de Kalil, que chegou a ocupar simultaneamente o cargo de diretor do Instituto Butantan e de sua fundação de apoio, a Fundação Butantan.
André Franco Montoro Filho, por indicação de Kalil, assumiu a fundação em 2015, mas eles se desentenderam no fim de 2016 e, segundo Uip, Kalil queria que o Butantan voltasse a ter só “um indivíduo com poder”. A divulgação por parte de Montoro Filho de possíveis irregularidades da gestão de Kalil teria sido a gota d’água.
“Chegou uma hora em que a situação ficou insustentável tanto do ponto de vista de exposição quanto do que é determinado pela secretaria. Houve uma quebra da relação de confiança do secretário com o gestor público”, diz Uip.
Kalil diz que a auditoria, realizada em 2015, teve todas as suspeitas de irregularidades respondidas antes mesmo de elas virem a público.
A Secretaria da Saúde comunicou que o médico hematologista Dimas Tadeu Covas será o novo diretor do Butantan. Ele é professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP e dirige a Fundação Hemocentro da cidade.