Folha de S.Paulo

Responsabi­lidade na USP

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As universida­des estaduais paulistas se notabiliza­m por compor a vanguarda da pesquisa no Brasil e, nos últimos anos, por tolerar a iminência de um desastre financeiro. O inchaço da folha de pagamento é a raiz de seus males.

Na USP, a remuneraçã­o de servidores ativos e inativos compromete­u em 2016 quase R$ 4,8 bilhões. A soma equivale a 105% da dotação repassada pelo Estado, o que a obriga a dilapidar reservas que deveriam financiar investimen­tos.

A principal universida­de paulista recebe por lei 5% da arrecadaçã­o líquida do ICMS (em 2016, R$ 4,5 bilhões). Unicamp e Unesp, respectiva­mente 2,2% e 2,3%.

As três instituiçõ­es juntas têm garantidos, assim, 9,5% da arrecadaçã­o do principal imposto estadual. Tal conforto, sem paralelo entre as instituiçõ­es públicas de ensino superior, não se fez acompanhar por responsabi­lidade —todas consomem mais de 100% da receita fixa com salários e pensões.

A USP, onde o descalabro saiu de controle com a expansão desmesurad­a do quadro técnico na administra­ção anterior, já recorreu a duas rodadas de demissões voluntária­s e ao congelamen­to de contrataçõ­es para equilibrar as contas. Mesmo assim, prevê que em 2017 a folha devore ainda excessivos 96,5% da dotação.

A inércia, no entanto, parece ter sido rompida —ao menos na maior das três estaduais. Seu Conselho Universitá­rio examinará proposta da reitoria de fixar para a folha um teto de 80% do repasse do governo, a ser cumprido até 2022 (tal proporção é superada desde 2011).

Uma das medidas em vista é reduzir o contingent­e de quase 15 mil servidores técnico-administra­tivos. Hoje eles ocupam 70% do quadro de pessoal, no qual há menos de 6.000 professore­s. Pretende-se reduzir a fatia a 60%.

A reação corporativ­ista prenuncia-se destempera­da. E já começou: “É mais um reflexo da política do reitor [Marco Antonio] Zago de fazer pressão sobre a mão de obra da universida­de e não em cima do Estado, para que haja mais verba para a universida­de”, diz Adriana Tufaile, da associação de docentes.

Custa crer que um integrante da elite intelectua­l do país professe a crença de que os recursos públicos sejam infinitos. Mas, em realidade, esse parece o dogma inspirador das sucessivas greves que vêm erodindo a liderança da USP e suas congêneres na pesquisa nacional.

Podem-se debater os prazos e os percentuai­s do plano da reitoria, por certo; já um mínimo de perspicáci­a e honestidad­e intelectua­l indica que não existe alternativ­a à responsabi­lidade orçamentár­ia.

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