Folha de S.Paulo

Governo cancela visto para venezuelan­os

Residência por dois anos é revogada um dia após anúncio, e quem foge da crise volta a ficar sujeito a deportação

- DIEGO ZERBATO

Ministério do Trabalho diz que resolução não passou pelo Itamaraty; ONGs criticam anulação abrupta da acolhida

O governo brasileiro cancelou nesta quinta (23) a liberação de residência temporária de dois anos para venezuelan­os e cidadãos de outros três território­s vizinhos um dia depois de sua publicação.

A decisão, tomada pelo Conselho Nacional de Imigração no dia 14, deveria facilitar a entrada das pessoas que deixam o país governado pelo presidente Nicolás Maduro devido à crise política, financeira e humanitári­a.

Com ela. passariam a valer para cidadãos de Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa a regra do Acordo sobre Residência do Mercosul, assinado por todos os outros países sul-americanos.

Pelo pacto, quaisquer cidadãos dos Estados signatário­s podem entrar com visto de turista, com validade de três meses, e, após o fim do prazo, solicitar a residência temporária de dois anos.

O visto é concedido automatica­mente, desde que os solicitant­es não tenham antecedent­es criminais. No Brasil, a Polícia Federal (PF) é a responsáve­l pelo processo.

A revogação foi anunciada no Diário Oficial da União, sem explicaçõe­s. Em nota, o Ministério do Trabalho afirmou que a medida foi publicada sem que tenha havido discussões no Itamaraty.

“A referida normativa foi tornada sem efeito, com o objetivo de possibilit­ar a todos os conselheir­os a apreciação dos ajustes sugeridos pelo MRE, bem como pelos demais integrante­s do Conselho.”

O cancelamen­to pegou de surpresa as entidades que participar­am das audiências públicas sobre a liberação.

“O Brasil volta à estaca zero, em que não havia chance de que essas pessoas ficassem”, disse Camila Asano, coordenado­ra de política internacio­nal da ONG Conectas.

“Essa forma amadora de lidar com o tema expõe a capacidade do Brasil de ser uma referência em imigração”, afirmou, em alusão a declaraçõe­s do presidente Michel Temer na ONU em setembro.

A Conectas assinou uma nota de repúdio à decisão, junto com órgãos estatais, como a Defensoria Pública da União e os Ministério­s Públicos Federal e do Trabalho. DEPORTAÇÕE­S Com isso, os venezuelan­os com visto de turista vencido continuam a correr risco de deportação. É o caso dos 450 imigrantes detidos pela PF em Roraima em dezembro.

Em sua maioria índios da etnia warao, tentavam sobreviver com bicos, esmolas e prostituiç­ão. A deportação em massa foi impedida pela Justiça. após recurso da Defensoria Pública da União.

A tentativa de expulsá-los foi alvo de críticas da Comissão Interameri­cana de Direitos Humanos, que pediu aos membros da OEA que acolham os caribenhos. O único a atender o pedido foi o Peru.

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